sábado, 20 de dezembro de 2014

O que não é preciso...

Enfim, estamos perto do fim de mais um ano.

Entretanto, mais tranquilizador do que o fim de um ano - que para mim, particularmente, começou da melhor maneira possível mas, no seu decorrer, incluíram algumas mudanças radicais e certas aflições - é o fim desse semestre acadêmico... Ufa! Em breve, muito breve mesmo, espero (e vou) concluir o mestrado que estou fazendo e abrir os olhos para novos rumos. 


Mas não é sobre isso que gostaria de falar aqui.

Sem delongas, o tema dessa postagem é baseado numa canção que descobri recentemente, chamada "O que não precisa", da Banda Resgate - nesse caso, pretendo dar uma "passeada" pela letra e discutir algumas coisas que têm me feito pensar desde que ouvi a música. Inicialmente, a letra diz:

"Você desprezou o amor e tudo que Ele já te deu
E deu muito mais valor a todas as outras coisas..." [1º verso]

Desprezo e valorização.


Primeiramente, quando ouço a palavra "desprezo", reconheço que existe o que se pode chamar de "desprezo bom" e também o "desprezo ruim" - "desprezo bom" seria algo relacionado com o não dar importância a coisas medíocres ou irrelevantes ou ainda rejeitar o que é injusto e/ou mau e, por outro lado, o "desprezo ruim" quase sempre decorre do orgulho de quem despreza [a atitude em si já é condenável] ou mesmo de ignorância e estupidez [por não saber o valor do que é desprezado, o desprezo existe]. Desprezamos coisas, determinados empregos, certos locais, conteúdos ditos ultrapassados, pessoas - especialmente pessoas (até aquelas a quem dizíamos amar), a ponto de as amarmos hoje e as abandonarmos na semana seguinte. Nesse contexto, uma das piores sensações na vida é a de não ser valorizado por alguém que se amou, ou seja, quem ama recebe em troca desprezo em vez de respeito e zelo. Mas existe algo pior do que isso - o desprezo ao amor Daquele que nos dá todas as coisas, inclusive o Seu amor: Deus. Na referida canção, "Ele" aparece na terceira pessoa do plural, como sendo Aquele que é substituído por "todas as outras coisas", como se elas tivessem (ou pudessem ter em si mesmas) mais valor do que Ele - Ele, cuja Lei é mais doce que o mel, em Quem todos os tesouros da sabedoria e da ciência estão escondidos, para quem tudo foi criado e que revelou-Se plenamente ao encarnar-se na pessoa de um humilde judeu, carpinteiro da Galileia, chamado Jesus, o Cristo

Nesse sentido, contrariando a postura daqueles que desprezam o amor (seja o amor do próximo - por achar que não precisa disso ou por não estar pronto a assumir os riscos que o amor traz consigo - e, claro, o amor de Deus), cito essas palavras atribuídas a Jesus:

Ele lhes disse: vocês são os que se justificam a si mesmos aos olhos dos homens, mas Deus conhece o coração de vocês. Aquilo que tem muito valor entre os homens é detestável aos olhos de Deus. [Evangelho de Lucas, cap. 16, vs. 15]


Não é preciso especular - o que consideramos como tendo muito valor [nesse caso, nossos próprios méritos, conceitos, virtudes etc.] para Deus é detestável. Ele, que é amor, não pode amar ou valorizar nada que insulte a Sua dignidade e a Sua glória - ou seja, aqueles que desprezam Seu amor e tudo o que Ele dá por dar muito mais valor a "todas as outras coisas" são alvo do desprezo Dele. Sinceramente, eu não posso imaginar nada mais horripilante e terrível que isso.

Por outro lado, a letra diz em outro trecho:

"Você correu como um tolo atrás do que os olhos vêem
E procurou mundo afora coisas que você já tem..." [2º verso]

Tolice e correr atrás do vento.


Tolice, conforme o senso comum, é a caraterística que define o tolo, o néscio, o insensato ou, em outros termos, o que "não tem noção". Na música, o "tolo" é aquele que corre em busca das coisas que estão diante de seus olhos mas... espere um minuto. Que tolice há (pode haver) nisso? Bastante, mais do que o que se pensa. 

Certa vez, o mesmo Jesus Cristo contou uma parábola na qual havia um homem rico que (na história) tinha produzido muito em sua propriedade, a ponto dele dizer que os celeiros antigos deveriam ser destruídos para que celeiros maiores fossem edificados [pois somente assim seria possível armazenar sua produção] e finalmente que, de agora em diante, era hora de desfrutar dos bens e de ter uma vida regalada. Considerando-se que, numa situação real, um homem como esse fazendeiro devia trabalhar muito para adquirir seus bens e confortos, ele pode ser incluído entre os que "correm atrás do que os olhos veem". Mas, de repente, Jesus aponta onde estava a tolice e diz

Louco, esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será?
Assim é com todo aquele que para si ajunta riquezas, mas não é rico para com Deus. 
[Evangelho de Lucas, cap. 12, vs. 20-21]


Correr atrás do que os olhos veem é tolice, pois tudo aquilo que se vê é temporal e transitório. Na verdade, muitos dos que correm atrás dessas coisas não precisam de muitas delas, tanto porque algumas dessas coisas não são de fato necessárias e, especialmente, porque quem "procura mundo afora" provavelmente já tem o que está procurando. Todavia, ironicamente, muitos de nós só percebemos que já temos o que precisamos [e/ou gostaríamos de] ter depois que "jogamos tudo fora" ou após "corrermos atrás do vento" e não acharmos nada. Em contrapartida, como escrevi no texto anterior, em Cristo [em quem está toda a plenitude divina] eu já tenho tudo o que preciso ter - ora, o que me faltar, Ele já me deu e, por isso, não preciso correr atrás do vento em busca do que não é necessário nem correr como um tolo atrás do que um dia vai acabar. Na verdade, como disse Jim Elliot, "não é tolo aquele que dá aquilo que não pode reter para ganhar aquilo que não pode perder"

Por último, a outra parte da música que me inquietou diz:

"Ele te deu as mais loucas pra confundir as mais sábias
E te deixou as mais fracas pra te livrar da tua força
E Ele escolheu bem as que não são pra te lembrar que você não é
E que não precisa ser o que não precisa..." [Final]

Lembrar que eu nada sou.


A esse respeito, a Bíblia registra alguns escritos do apóstolo Paulo a uma comunidade de cristãos do primeiro século outrora intelectual e pervertida [a população de Corinto, cidade muito importante da Grécia Antiga], onde se lê:

Mas Deus escolheu as coisas loucas desse mundo para confundir as sábias, e escolheu as coisas fracas desse mundo para confundir as fortes.
E Deus escolheu as coisas vis desse mundo, e as desprezíveis, e as que não são, para aniquilar as que são, para que ninguém se glorie perante Ele. [1 Coríntios 1, vs. 27-29] 

Não seria possível ser mais contundente: Deus escolheu as coisas loucas, fracas, vis, desprezíveis e sem valor para que ninguém se glorie diante Dele. Ou seja, não são os "nobres" ou membros da "high society" nem os "politicamente corretos e defensores dos fracos e oprimidos" e muito menos aqueles que "acham que não cometem pecado", que "não enganam a si mesmos" e que se autointitulam "O bem" - eu já tinha visto de tudo, mas tal burrice chega a ser pior que a declaração mais patética - que são escolhidos por Ele. Em outras palavras, quem escolhe é Ele - essa conversinha de que "o meu destino não é de ninguém" e que "eu sou o dono do meu passado, presente e futuro" não existe - e, se qualquer um de nós se julga muito importante, virtuoso, nobre, impecável, elevado, evoluído ou qualquer coisa do tipo, provavelmente esses já foram rejeitados. Deus resiste aos orgulhosos, e dá graça aos humildes - quanto mais alguém se reconhecer como "nada", mais perto da graça de Deus estará. 

Não existe nenhum espaço diante de Deus para os metidos a besta que murcham com um simples furo no balão de seus egos infladinhos, pois chegará o dia em que toda arrogância será abatida e só Deus será exaltado. Se alguém porventura não está se dando conta disso, é melhor começar a se importar - uma hora pode ser tarde demais, pois Deus mesmo diz para que O busquemos enquanto Ele pode ser achado, implicando que num futuro porvir ninguém mais poderá encontrá-Lo. Não existe penúria ou tormento que possa se comparar a isso


Não ser o que não é preciso.

Em um mundo onde "todos devem ser iguais a todos" e onde "fazer um bom papel" é mais importante do que "ser o que se é", eu prefiro as palavras do Marcelo Jeneci, que disse que "felicidade é só questão de ser". Felicidade é, antes de tudo, questão de saber que não se é nada - e, depois de se saber que não se é nada, é possível ser apenas o que é preciso. Nesse contexto, felicidade é só questão de ser o que Deus deseja - Ele mesmo afirma, por meio de um dos profetas bíblicos, que nós fomos feitos para a Sua glória, de forma que os que não glorificam a Deus como Deus não estão vivendo para o propósito para o qual foram criados. Enfim, Ele escolheu as coisas que não são nada para me mostrar que eu também não sou nada e, assim, eu não preciso ser o que não é preciso - isto é, quem esperou ou ainda espera que eu satisfaça qualquer capricho pessoal ou expectativa barata, é hora de desistir enquanto há tempo. Eu só buscarei ser o que preciso ser e, em poucas palavras, eu só preciso ser semelhante a Ele


O que você tem sido - alguém dentre os muitos com seus egos inflados ou simplesmente um dos poucos que se veem como nada?
O que você tem achado que precisa ser - mais uma "maria que vai com as outras", sem convicções e autenticidade ou tão-somente o que Deus disse para que você seja?






Pela alegria de ser o que preciso ser Nele,





Soli Deo Gloria!

Nenhum comentário:

Postar um comentário