domingo, 28 de setembro de 2014

O post que não é sobre mim...

Estou de volta aqui, mas a demora foi necessária. 

Nos últimos dias estou experimentando diversos e violentos turbilhões na mente, e esse texto de hoje, na verdade, pretende ser uma síntese fiel e descompromissada com aprovação - seja de qualquer leitor e até mesmo de mim. Eu até gostaria que esse post fosse escrito por outra pessoa mas, de fato, quem tem que continuar dando a cara a bater sou eu. 


Esse post é um manifesto público e audacioso contra a "cultura selfie" tão em voga em nossos dias, cultura essa que simplesmente evidencia em "alto e bom som" (ou seria mau?) que somos viciados em nós mesmos - viciados em nos exibir, em buscar satisfazer nossa cobiça insaciável a qualquer custo, em nossa reputação e autoimagem, em nossa suposta "superioridade" (seja intelectual, seja moral, seja comportamental, seja econômico-social e também espiritual) e, finalmente, em arrogarmos para nós mesmos glória, direitos e méritos. E, embora sejamos tão solícitos em apontar o egoísmo alheio, dessa vez a intenção desse texto é atingir a todos - seja eu, seja você. Se a carapuça servir, o problema é meu, é seu, é nosso. 

Não é sobre mim. Não é sobre você. Mas, ao mesmo tempo, é sobre cada um de nós.

Como assim?


Primeiramente, não é sobre minhas opiniões ou sobre minhas "verdades".

Cada um de nós tem concepções, opiniões e perspectivas a respeito da vida e de tudo o que a ela se refere. Nesse contexto, a "cultura selfie" mencionada acima se mostra no fato de que, mais do que em qualquer outra época (provavelmente), nossas opiniões e "verdades" se baseiam tão-somente em conveniência e satisfação pessoal. Isto é, se algo nos faz "sentir bem" por atender a nossos caprichos e desejos e/ou se todos fazem (logo, é "certo", embora "certo e errado" sejam relativos não é?) e, por isso, qualquer postura contrária é "preconceito" e "intolerância", é isso que passamos a defender e praticar. Não se pode criticar nada, opinar sobre nada ou nem mesmo "pensar" diferente, porque a "geração mimimi" na qual estamos inseridos dará seus "chiliques" e irá se "manifestar" em suas vadiagens e sete cores vivas, ou mostrará todo o seu "amor fraternal" defendendo seus "gurus espirituais" com ataques ridículos a quem procura falar a verdade, doa em quem doer - ora, ninguém pode tocar nos "ungidos do Senhor", ninguém pode falar assim do Dr. Fulaninho, PhD. em sociologia e "professor quase-deus" da faculdade Y, nem mesmo falar sobre quaisquer princípios de vida e fé que "incomodem". Ah, se qualquer um de nós ainda é assim, todo cheio de "não me toque" ou de "frescurinhas", já está na hora de virar homem (ops, isso é machismo!) - melhor, virar gente madura e encarar que o universo não tem como centro o nosso umbigo. Mais do que isso, precisamos encarar a verdade de que há apenas uma única Verdade - a verdade que é uma Pessoa, que disse de Si mesma "eu sou A Verdade, eu sou O Caminho, eu sou A Vida". Se a nossa "verdade" não se chama Jesus Cristo, estamos nos enganando. Não tem jeito


Não é sobre nossa realização pessoal.

Por outro lado, outro aspecto identificador dessa "cultura selfie" é a busca ansiosa, desenfreada e doentia pela "realização pessoal" - nesse sentido, me recordo das palavras do sábio rei Salomão que disse que "todo o trabalho do homem é para sua boca, e contudo a sua cobiça nunca se satisfaz". Quanto mais corremos atrás de "coisas" na expectativa de que, quando conquistarmos essas "coisas", seremos "felizes e plenos", mais percebemos que nada disso adianta - pois, logo depois que alcançamos o que estávamos procurando, continuamos descontentes. Ou seja, ao corrermos à procura da felicidade nas "coisas" (dinheiro, sexo, poder, prestígio, conhecimento, títulos etc.), estamos, verdadeiramente, correndo atrás do vento. Como dizia o mesmo Salomão, tudo é vaidade - tudo. Ora, esse mesmo Salomão conquistou e desfrutou de tudo o que seus olhos desejaram mas, no fim de sua vida, ele afirmou que tudo tinha sido inútil. Obviamente, é bom desfrutar das coisas boas da vida, porém tudo acaba, perece, se consome, se desgasta, se desfaz. Não é possível levar nenhum desses "deleites temporais" para nossa sepultura, pois "tudo o que não é eterno é eternamente inútil".  

Entretanto, não basta apenas saber que as coisas passageiras são inúteis no fim das contas - é necessário reconhecer que nosso empenho diário para adquirir essa "realização pessoal" é, quase sempre, egoísta. Queremos mais e mais dinheiro na conta, mais viagens, mais roupas de grife, carros importados, imóveis em bairros de luxo, parceiros ou parceiras, mais poder e mais honra, mais renome ou fama e mesmo mais seguidores nas redes sociais. Tudo isso é egoísmo. Tudo isso é egolatria. E, para ser sincero, eu vejo isso tanto naqueles que vivem suas vidas para si mesmos quanto naqueles que dizem que vivem para Deus [particularmente dentre os "cristãos"] - por exemplo, eu mesmo. São os "admiráveis lamentáveis religiosos", amantes de si mesmos e amantes da glória que eles deveriam (e devem) dar apenas ao Deus que dizem servir. Se nos julgamos discípulos do Mestre Carpinteiro (o Deus-Homem), está na hora de andarmos como Ele andou, amando o próximo e dando a vida por eles. Sim, dói saber que a carapuça serve. 


Não é sobre nosso ativismo religioso ou sobre nosso "ministério".

De fato, é muito mais fácil perceber defeitos ou falhas em atitudes do lado de fora dos "arraiais religiosos" - especialmente para quem é religioso. No entanto, quando penso na frase "isso não é sobre mim" e, ao mesmo tempo, em minha realidade como religioso (cristão), vejo que o nosso "ativismo" ou o nosso "desempenho" é a pior das armadilhas - ora, quanto mais "fazemos coisas para Deus" (seja estudar em um seminário e, ao mesmo tempo, fazer teatro, instrumento, canto, ministério infantil, participar de projetos missionários ou se envolver em grupos cristãos na universidade), mais estamos sutilmente suscetíveis a um orgulho sorrateiro e pernicioso. Logicamente, quem olha para a vida de alguém que faz todas essas coisas (particularmente ao mesmo tempo) de imediato pensa e diz: "que pessoa consagrada, que bênção!". E, se nós somos os alvos desses "elogios", nosso ego se infla violentamente, mas mesmo assim não percebemos - estamos muito ocupados "servindo ao Senhor" ou "cumprindo nosso chamado" para cuidarmos do nosso orgulho disfarçado. Contra tudo isso, cito um trecho de uma música que ouvi esses dias enquanto participava de uma conferência que inspirou esse post, a qual diz:

"É mais que ter um ministério, é cada dia ser mais servo..." [Bruno Gusmão]

Eu vou mais além - não é sobre ter um ministério, é sobre cada dia ser mais servo. Não é sobre o que eu faço e nem sobre quantas tarefas eu desempenho, mas é sobre quem estou me tornando. Não é sobre quantas regras e desafios eu obedeço à risca, mas é sobre a consciência de que a única forma de agradar a Deus não é tentando agradá-Lo mas, sim, buscando imitá-Lo. Ora, Ele só aceita aquilo que procede Dele mesmo e, por isso, apenas o que é conforme ao que Ele faz e determina é agradável a Ele, pois as boas obras para as quais fomos criados (e que devemos praticar) foram preparadas por Ele, preparadas de antemão


Não é sobre o nosso renome nem sobre a nossa honra. 

Enquanto todos nós continuamos a "querer ser Deus", o Deus (que não é nenhum de nós) diz que "não dará a Sua glória a outrem nem o seu louvor a ídolos". Sobre esse mesmo Deus, único e todo-poderoso, se diz que "Dele, por Ele e para Ele são todas as coisas, a Ele seja a glória eternamente". Não há espaço para usurpações de nossa parte - Deus é quem merece, total e continuadamente, ser adorado, louvado, engrandecido e exaltado. Glória é algo que não é propriedade de ninguém além do próprio Deus, porém muitos de nós que dizemos louvá-Lo agimos como "ladrões de glória" - queremos manipular o universo a nosso favor, julgamos ter poderes mágicos que se transfiguram em orações e "palavras proféticas" falsamente humildes (ou mesmo abertamente arrogantes) e queremos impressionar todos ao nosso redor com nosso "bom comportamento" mascarado de "bom testemunho". Chega! Chega de tanta hipocrisia, incoerência, falsa piedade, falsa integridade, exibicionismo religioso e autoglorificação humana! Não existe honra que não pertença a Deus, uma vez que a verdadeira honra vem somente Dele; logo, se nos consideramos servos Dele, viveremos sabendo que não somos nada e que Ele é tudo.


Finalmente, ao olhar para mim mesmo, posso saber que nada sou. 
O espelho que Deus põe diante de mim também me faz saber que nada posso fazer

Logo, o que resta é me render a Ele, arrependido de quase sempre viver para o meu próprio ventre ao fazer dele o meu deus, saciando meus apetites impuros e egocêntricos e, assim, me fazendo inimigo da cruz do Cristo que me resgatou. Se algum de vocês que leu esse post também se reconheceu como "dono das verdades" e das "opiniões incontestáveis", um "psicopata da autorrealização", um ativista religioso e "idólatra do próprio ministério" e, por fim, até mesmo como um "ladrão" da glória que é devida somente a Deus, arrependa-se agora mesmo - você pode ser um pastor, missionário, teólogo, filósofo, professor renomado ou mesmo alguém sem muita instrução e prestígio social. Não importa. Todos precisamos de arrependimento diário e genuíno, pois essa é a única maneira de mostrarmos (especialmente para nós mesmos) que vivemos Nele, por Ele e para Ele. Mas, claro, não é sobre "a nossa autenticidade de vida com Deus", mas sim sobre a realidade do poder da graça Dele em nós, pela qual Ele nos faz semelhantes a Si mesmo. Ele é tudo que importa. 






Pela alegria de saber que nada é sobre mim,





Soli Deo Gloria!

domingo, 14 de setembro de 2014

O paradoxo do meu palco...

Eis-me aqui, outra vez.

Após os megafones que soaram no post passado, desta vez eu continuarei a dar ênfase a expressões fortes e à transparência, sem máscaras - eu sei que darei a minha cara a bater e, ao fazer isso, poderei parecer um "falso humilde" ou qualquer coisa do tipo... Não me importo.  

Ora, esse blog não é uma tentativa superficial de exibir uma superioridade moral, intelectual e, obviamente (por se tratar de um blog escrito por um cristão) espiritual - é apenas um forma que encontro de mostrar que o mundo é real, que as pessoas não são "mocinhos e mocinhas de contos da fadas" ou "heróis e heroínas de filmes de Hollywood" e, sobretudo, por mostrar que somos todos miseráveis, procuro provar que há apenas Um a Quem deve ser dada toda glória


O título deste post se baseou numa frase da canção da banda de rock brasileiro Palavrantiga, onde se diz:

"Eu monto um paradoxo no palco, você anda zombando da Cruz..." [Rookmaaker - Palavrantiga] 

Paradoxo.

Segundo o Dicionário Informal online, paradoxo significa "conceito que é ou parece contrário ao comum, contrassenso, absurdo ou disparate". Em outras palavras, "paradoxo" se relaciona a incoerência, controvérsia e inconsistência - é algo que nos faz ter reações como "como assim?", "não faz o menor sentido" ou "quem diria, não é?" Em suma, o paradoxo pode nos surpreender ao nos desvendar certas coisas como elas [de fato] são ou pode nos fazer ter concepções erradas a respeito de outras coisas bem como de pessoas, visto que muitos dos paradoxos são superficiais e, portanto, não correspondem à realidade como um todo. Por outro lado, o fato é que todos nós somos, em certa medida (seja mais, seja menos), "paradoxos ambulantes" - todos temos nossas inconsistências, controvérsias, disparates e/ou (como disse em um post mais antigo) nossos "50 tons de incoerência". Eu não escapo dos paradoxos, nem você e nem ninguém. Se você acredita ser a "coerência encarnada" e tem se iludido com isso, eu sinto muito por sua ilusão. 


O "paradoxo" que cada um "monta no palco". 

Dentre os vários "paradoxos" que cada um de nós "monta nos palcos do dia-a-dia", eu gostaria de falar dos meus próprios paradoxos - sim, eu mesmo, que escrevo/falo/argumento/leio/aprendo sobre humildade e autocontrole mas destilo autossuficiência em muitas de minhas palavras e irrompo em fúria por coisas bobas, como a lentidão do computador, o leite em pó derramado ou mesmo ao ver erros nos downloads do iTunes. Sim, pessoas de personalidade ardente, pertinaz e indomável como a minha sempre são os mais controversos e, especialmente quando (por um lado) se luta contra todas essas inconsistências e (por outro) frequentemente se pratica, gente assim sempre acaba incomodando mais ou perturbando a "ordem" e, em tudo isso, causando mal a muitos ao redor ou dando a impressão de que é do tipo "duas caras". Às vezes isso faz sentido, mas muitas vezes a controvérsia não implica falsidade ou ilegitimidade - na verdade, os mais falsos normalmente parecem ser os mais coerentes ou menos paradoxais pois, como disse certo poeta, "tudo aquilo contra o que sempre lutam / é exatamente tudo aquilo que eles são"

Resumidamente, os paradoxos do meu palco me fazem lembrar de um dilema relatado por certo escritor bíblico do primeiro século, talvez um dos registros mais transparentes já escrito:

Porque eu sei que em mim, isto é, em minha carne, não habita bem algum; pois eu tenho o desejo de fazer o bem, mas não consigo realizá-lo.
Porque eu não faço o bem que quero, mas o mal que não quero esse eu faço.
Ora, se eu faço o que não quero, já não o faço eu, mas o pecado que habita em mim. 
[Epístola de Paulo aos Romanos, cap. 7, vs. 18-20]


Não há como ser mais explícito - em nossa natureza humana não há nada de bom que nos permita fazer o bem, ainda que o desejemos. Vez por outra, sempre caímos em erros e pecados recorrentes, mesmo aqueles dos quais sempre nos arrependemos e procuramos abandonar. No fim das contas, o ensino dessa passagem consiste na realidade relutante do pecado dentro de nós - no caso, daqueles que foram alcançados pela graça de Deus por meio de Jesus Cristo, mas ainda são humanos e imperfeitos - e, por isso, praticamos o mal que odiamos em vez de fazer o bem que amamos. Enfim, somos os protagonistas desse "espetáculo de contrassensos" e, a cada "palco montado" por nós, novos paradoxos são (e serão) inevitavelmente exibidos. Não tem jeito, como diz outra música: "...o bem que eu quero, esse eu não faço / o mal que não quero, persegue os meus passos..." [Meus passos - Oficina G3]. "Isso é o que somos nós" agora, mas "no desapontamento a esperança nasce" - a esperança de que Aquele que é santo e justo se manifestará e, a partir desse momento, seremos semelhantes a Ele. 

Você anda zombando da cruz.


Primeiramente, "zombadores da Cruz" [no sentido literal] existiram desde o dia em que Jesus foi crucificado, pois muitos disseram "...se Tu és o Filho de Deus, salva a Ti mesmo e a nós..." - inclusive um dos homens que foi crucificado juntamente com Ele. Em nosso contexto, os "zombadores da Cruz" podem ser tanto aqueles que ignoram tudo o que diz respeito a Cristo e ao cristianismo quanto os que até possuem certa religiosidade mas, por concepções distorcidas da totalidade da verdade, estão prontos a lançar críticas e difamações - sem contar, é claro, os que dizem seguir o Cristo crucificado e ressuscitado, mas O negam com sua conduta e caráter. Nesse sentido, recordo-me de outros escritos do mesmo Paulo:

Você, pois, que ensina a outro, não ensina a si mesmo? Você, que diz que não se deve furtar, furta?
Você, que diz que não se deve adulterar, adultera? Você, que detesta os ídolos, rouba-lhes os templos? 
Você, que se gloria na Lei, desonra a Deus pela desobediência à Lei?
Pois, como está escrito: "o nome de Deus é blasfemado entre os gentios por causa de vocês". [Romanos 2:21-24]


Pra variar, mais uma vez está mais do que claro - se falamos contra ou concordamos com certas posturas ou princípios, devemos olhar para nós mesmos antes e ver se estamos vivendo de acordo com o que defendemos, pois se "falamos uma coisa e vivemos outra", só nos resta dar razão para que o nome de Deus seja difamado. Obviamente, devido à natureza corrupta do ser humano, todos naturalmente odeiam a Deus e estão em inimizade contra Ele [e, por isso, blasfemam Dele], mas se eu me considero [mesmo que seja com toda a humildade] um discípulo fiel do Cristo, eu não tenho outra opção a não ser a coerência e a consistência - isto é, a busca pela crescente superação de todos esses paradoxos. Está na hora de sairmos da teoria da "integridade ideal" para uma busca prática da "integridade real" - sim, algumas vias serão íngremes ou sinuosas, também cairemos e/ou tropeçaremos durante o percurso, mas isso não deverá ser uma desculpa esfarrapada para sairmos do Caminho. Deus deve ser levado a sério e, se algum de nós ainda não se deu conta disso, queira o próprio Deus que possamos nos dar conta antes que seja tarde demais. 

Porém, minha preocupação com a boa conduta como resultado do estilo de vida que professo adotar não está em nada ligada à minha reputação pessoal - eu "não estou nem aí" se desaponto as expectativas de alguns que me cercam por causa de meus "instantes de ira destemperada" ou se sou criticado porque alguns confundem convicção e firmeza com arrogância [embora eu saiba de meu próprio orgulho]. Eu lamento frustrá-lo, mas não tenho qualquer compromisso em ser seu bajulador - a única causa digna que me motiva a viver de modo coerente é me "apresentar aprovado diante Dele", pois "se eu procurasse agradar a homens, eu não seria servo de Cristo"


Finalmente, acredito que minha peregrinação - particularmente, essa é a melhor palavra para definir a minha vida hoje - será como vi num trecho de um livro há alguns anos, atribuído ao nobre escritor russo Liev Leon Tolstoi - não me lembro do que li de forma literal, mas recordo que havia um bêbado que voltava para sua casa andando pelas ruas, cambaleando e às vezes tropeçando... No fim da história, o bêbado consegue chegar em casa e encontra o descanso que tanto buscava. Ou seja, todos nós [de certa maneira] somos como esse ébrio ao seguir a Cristo - deslizamos em certas fraquezas e, quando damos conta de nossos erros e pecados, nos arrependemos e mudamos de direção em busca do lugar ao qual pertencemos. Nessa jornada de retorno, podemos tropeçar e cambalear mas, se sabemos de onde viemos e temos raízes firmes nisso, um dia chegaremos em casa. Trocando em miúdos, se sabemos que somos de Deus por verdadeiramente crermos em Cristo, jamais encontraremos satisfação e descanso para a alma fora Dele. Vacilos e falhas sempre existirão, porém são os que se reconhecem incapazes em si mesmos que estão aptos a receberem a graça Dele para poder caminhar - ora, os "donos da boa moral" e adeptos da "política da boa vizinhança" já se acham agraciados demais; Deus me livre de ser como eles.


E você? Quais são os paradoxos que você exibe nos seus palcos?
Você tem sido um "zombador da cruz" ou tem se dobrado diante Daquele que morreu nela para salvar pecadores como eu e você?





Pela esperança de que Nele os meus "paradoxos" terão fim,





Soli Deo Gloria!

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Quando Deus usa megafones...

Dessa vez não demorei muito pra voltar.

Acredito que os textos anteriores tem sido um tanto mais aceitos pelos leitores - tenho buscado ser mais brando e menos áspero, admito - mas, na verdade, ao olhar para esse lado mais ameno de minhas reflexões, acho que falta alguma coisa. Sim, acredito que sou mais "eu mesmo" ou mais "autêntico" quando o "filtro" fica um pouco de lado e a verdade aparece como ela é. Então, que assim seja.


Sem perda de tempo, esse texto é, predominantemente, produto de minhas reflexões do livro "O problema do sofrimento", escrito por C. S. Lewis nos anos 40 do século XX e meu atual livro de cabeceira. Ao longo da leitura, me deparei com uma frase que me fez parar e pensar um bom tempo:

"O sofrimento é o megafone de Deus para despertar um mundo surdo". [C. S. Lewis]

Sofrimento.

Talvez essa seja a palavra mais odiada, combatida, não-aceita e incômoda para a existência humana. Não apreciamos o sofrimento. Fugimos dele diariamente, a todo instante. Não importa se somos religiosos ou não, ricos ou não, intelectuais ou não, brancos ou negros, brasileiros ou australianos, nada disso importa - ninguém gosta de sofrer [inclusive eu]. Mas o fato é que sofremos, muito ou pouco, mas sofremos. O sofrimento é algo inevitável para nós, seres humanos, e mesmo para toda a natureza - basta observar os desmatamentos, a poluição atmosférica e das águas (fluviais e marítimas), a pesca predatória e demais ações violentas contra a fauna (bem como contra a flora). De certa maneira, o sofrimento permeia toda a existência pelo Universo e, enquanto estivermos nesse corpo físico, todos nós estaremos sujeitos a ele. Não se iluda com slogans do tipo "pare de sofrer!" ou "seus problemas acabaram!" - não se iluda mesmo. O sofrimento sempre estará presente por aqui, quer queiramos ou não. 


Mas... o sofrimento é mesmo o megafone de Deus? Isso faz mesmo sentido?

Sim. Faz todo sentido.

Primeiramente, uma vez que cada um de nós (sem qualquer exceção) naturalmente não tem prazer ao lidar com o sofrimento [de modo que nos opomos a ele a qualquer custo], o que buscamos avidamente é estabelecer sobre nossas próprias vidas [assim como sobre as vidas dos outros] a "ditadura da felicidade". A Ditadura da Felicidade, como marca da sociedade hedonista e autocentrada de hoje, nos tornou surdos para a realidade que nos cerca - tão surdos que não percebemos os gritos silenciosos de nossa própria alma vulnerável aos sofrimentos do dia-a-dia e, especialmente, surdos em relação ao clamor e à dor do próximo. Mais do que nunca, estamos tão voltados para o nosso próprio umbigo - o que importa é a minha realização pessoal, é meu conforto emocional, é minha "consciência tranquila" [ou seja, o que importa é ser feliz e o resto é resto] - que, possivelmente, nossa maior necessidade é ouvir o alerta divino em alto e bom som: chorem com os que choram, defendam a causa da viúva, acolham o estrangeiro e o órfão, ouçam o clamor do pobre, levem os fardos uns dos outros. Deus ergue o Seu megafone e faz ouvir Sua voz; quem tem ouvidos para ouvir, ouça.


O mundo precisa ser despertado.

Curiosamente, a sociedade mais antenada, conectada, tecnológica e frenética é a mais desatenta e desapercebida do que está ao redor de si mesma - por exemplo, qual de nós não perde diariamente alguns bons minutos digitando mensagens no celular enquanto a vida acontece fora do WhatsApp? E não somente isso, estamos tão ocupados olhando nosso "inbox", publicando um novo "tweet" ou atualizando nosso Instagram e não vemos as pessoas nas esquinas sem comida, usando drogas, dormindo no chão frio [até mesmo em dias de chuva] ou, por outro lado, ignoramos aqueles que precisam de uma palavra de ânimo ou tão-somente de ser ouvidos por nós. 

Com isso, não quero afirmar que esses recursos tecnológicos não possam ser usados para o benefício do outro, porém na maior parte do tempo eles nos entorpecem para a "vida real" - nos afastamos uns dos outros, julgamos as pessoas apenas pelo "ter visualizado a mensagem" e não ter respondido, perdemos a oportunidade de cultivar amizades e bons relacionamentos "olhando nos olhos" ou mesmo ouvindo-se a voz do outro lado da linha durante aquelas ligações intermináveis. Nos tornamos viciados em superficialidade e, como resultado natural, o sofrimento do outro já não nos incomoda mais - a não ser que saiamos em desvantagem. Em contrapartida, Deus continua levantando Seu megafone e ressoando o Seu grito, como está escrito:

"Porque toda a Lei se resuma nesta palavra: amarás o teu próximo como a Ti mesmo". [Gálatas 5:14]

No entanto, a realidade que construímos mostra que estamos afundados em nosso egoísmo. Sim, precisamos ser despertados. 


Porém, esse não é o pior lado da história. 

Quando C. S. Lewis disse que "o sofrimento é o megafone de Deus para despertar um mundo surdo", ele mostra que Deus pode até sussurrar em nossos prazeres, entretanto Ele brada em meio à nossa aflição - ou seja, é no meio do desespero e da angústia que a voz Dele se torna mais audível, pois assim percebemos que não nos resta nada a não ser Ele. Além disso, a ideia de que o sofrimento é o "megafone de Deus" traz consigo o fato de que a "temporária felicidade" de muitos que vivem suas próprias vidas como bem entendem [fazendo o mal aqui e acolá] um dia dará lugar ao sofrimento. Jesus Cristo, Aquele que amparou e consolou todos os sofridos e angustiados que encontrou enquanto esteve entre nós, disse certa vez:

Mas ai de vocês, que são ricos, pois já receberam a sua consolação.
Ai de vocês, que agora tem fartura, porque passarão fome.
Ai de vocês, que agora riem, pois haverão de se lamentar e chorar. [Lucas 6:24-26]


Sim - foi Jesus que disse isso. Essa conversa de que Jesus era especialista em "passar a mão na cabeça", colocar "panos quentes" e "amaciar o ego" não tem nada a ver com o Jesus relatado nas Escrituras. Ele diz claramente, como se estivesse com um megafone em uma de suas mãos, "ai de vocês!" Ai! Ai! Posso tentar imaginar a cena, como se Ele gritasse veementemente aos ouvidos dos que estão sonolentos: "...escutem-me, ouçam a minha voz, pois os dias de alegria estão contados, a felicidade vai desaparecer repentinamente, a fartura vai deixar de existir e os risos darão lugar ao choro...". Na direção contrária, Ele diz bem perto do trecho anterior:

Bem-aventurados vocês, que são pobres, pois o reino de Deus pertence a vocês.
Bem-aventurados vocês, que agora tem fome, pois serão satisfeitos. Bem-aventurados vocês, que agora choram, pois haverão de rir.
[...]
Regozijem-se nesse dia e saltem de alegria, porque grande é a sua recompensa no céu.
[Lucas 6:20-21, 23]


Resumindo, Jesus mostra que existem duas realidades simultâneas agora e que, no futuro, haverá uma inversão de realidades - alguns desfrutam da vida hoje conforme seus próprios conceitos e ignoram a Deus, enquanto outros sofrem perdas e escassez, todavia permanecem olhando para o Alto. Para estes últimos, o que está reservado é o reino de Deus [um reino eterno, onde não há tristeza ou pranto, e que jamais será destruído] mas, para os primeiros, Jesus fala que o sofrimento baterá à porta deles - baterá à porta e invadirá suas casas, destruindo tudo o que estiver lá dentro, de forma que nenhum deles poderá escapar. Sem delongas, esse será um sofrimento eterno e irreversível, pois a Voz que assim proclamou é a voz divina, diante da qual a terra e o inferno tremem. Logo, é qualquer um de nós que pode ousar tentar resistir?


O megafone de Deus ainda soa e nos avisa firmemente para "sairmos sem olhar para trás" antes que o "fogo e enxofre" advindos de Sua ira caiam sobre nós e nos consuma, a fim de que possamos buscar a Ele enquanto Ele pode ser achado e invocá-Lo enquanto Ele está perto - mas não O busquemos de qualquer maneira, pois apenas os que O buscam de todo o coração O encontram. Desse modo, nos encontramos com Aquele para Quem fomos criados e, assim, desfrutamos da vida eterna, que consiste em conhecê-Lo como único Deus verdadeiro e a Quem Ele enviou, Jesus Cristo.

Você tem ouvido o som do megafone de Deus - tem olhado para o sofrimento do outro com compaixão, aceitado as aflições da vida como algo inevitável e, sobretudo, já foi despertado para a realidade do sofrimento eterno para que O busque? Não seja como os "surdos da cidade dos homens", mas faça parte da "gente que consegue ouvir".





Pela alegria de ter ouvido a Voz dele e ter seguido,





Soli Deo Gloria!