Você
não está no blog errado. O título do post é esse mesmo.
Depois
de um texto mais lúdico, no qual fiz referências a cidades ideais e reinos
imaginários (como Pasárgada, Nárnia e Atlântida) como figuras do céu e da
eternidade [embora tenha também ressaltado a questão da tolice do homem em
querer ser seu próprio Deus], minha intenção neste post é ser mais ácido,
áspero, sem meias palavras mesmo. Já que não pretendo me candidatar a prefeito
da minha cidade (esse ano é ano eleitoral nos municípios do Brasil), não tenho
que estar preocupado com a retaliação e a impopularidade que deverão me seguir
depois deste texto. Não é pressão psicológica; você ainda pode sair deste blog, antes de começar a se revoltar
contra mim ao ler o que está por vir. Eu não estou brincando.
Mediocridade. Tenho pensado nessa palavra
há um bom tempo e, depois de um período de reflexão, cheguei à seguinte
conclusão: eu, você, nossos pais, nossos familiares, os colegas da escola, da
faculdade e até as pessoas da igreja [infelizmente, acho que principalmente
essas últimas] somos viciados em
mediocridade. Todos são. TODOS. Nós
amamos ser medíocres e nos orgulhamos de nossa própria mediocridade (o que é
ainda mais medíocre). Curiosamente e enganosamente, a mediocridade nos dá
prazer, sensação de plenitude, de superioridade e de retribuição diante dos
outros por aquilo que, supostamente, fizeram contra nós. Porém, como
todos são medíocres, todos constituímos um ciclo vicioso de mediocridade
– no qual os nossos defeitos e mazelas de caráter se manifestam em toda a sua
força e, como resultado, transmitimos uns aos outros a contaminação e a
amargura que permeia as nossas mentes e corações. Sinceramente, nada é mais
venenoso e maléfico (pelo menos, do ponto de vista das relações humanas) do que a mediocridade. Entretanto, nós
somos os peçonhentos da história. Ainda dá tempo de você desistir de ler o
texto até o final. Sério.
A mediocridade
está em toda parte.
Nas discussões repugnantes das CPIs (ou na falta de discussão, já que os
criminosos estão preferindo ficar calados ultimamente) e nos programas de TV do
domingo, nas brigas de torcidas organizadas por causa de algo que deveria
trazer diversão e nas reclamações por causa da pia cheia de pratos e talheres
sujos [na verdade, você deixa a pia limpa e ouve reclamações e, se não faz,
ouve do mesmo jeito!], nas disputas por herança de família e no complexo de
superioridade moral tão comum entre os religiosos. A mediocridade nos acompanha
ao longo do quarteirão e, na próxima esquina, ela estará nos esperando. Por
outro lado, os outros são seguidos por ela na medida em que também andamos e,
quando eles nos encontram na esquina da rua seguinte, lá está ela. “Mediocridade.
Mediocridade” - sejamos ateus ou hinduístas, racionalistas ou panteístas,
cristãos ou budistas, esse é o nosso mantra de cada dia. Mediocridade – essa é a nossa palavra de
ordem. Mediocridade – esse é o lema natural da vida humana. Mediocridade.
Mas,
o que é mediocridade?
Sem
me prender ao dicionário, poderia definir mediocridade como “aquilo que é negativamente mediano, banal,
trivial, desprezível etc.”. Logo, ser medíocre é ser médio, é ser como os
demais, é não ter diferencial, é ser descartável – ora, se algo é descartável,
ele serve apenas por um breve momento e, depois de usado, é jogado no lixo. Os
medíocres são dignos do mesmo destino; desse modo eu, por mim mesmo, sou igualmente descartável e sem qualquer
importância. Mas você também é. Os seus ídolos também são. Os seus maiores
referenciais também. Todos nós somos, por nós mesmos, descartáveis. Por
outro lado, se você conseguiu chegar até esse ponto do texto, você é um leitor
sobrevivente, visto que conseguiu ler um monte de palavras “medíocres” escritas
por um blogueiro ainda mais “medíocre”. Nada mais, nada menos.
Em
contrapartida...
Por
que “dar importância” a essas palavras medíocres? Será que é possível tirar
algum proveito disso tudo?
Talvez.
Pois,
sempre que penso em mediocridade, me lembro de uma história narrada no
evangelho segundo Lucas, a qual está relatada abaixo:
“Jesus disse
também essa parábola a uns que confiavam em si mesmos, crendo que eram justos,
e desprezavam os outros:
Dois homens
subiram ao templo para orar; um era fariseu, e o outro publicano. O fariseu,
estando em pé, orava consigo desta maneira: Ó Deus, graças Te dou, por que não
sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como
este publicano. Jejuo duas vezes por semana e dou os dízimos de tudo quanto
possuo. O publicano, porém, estando em pé, de longe, nem ainda queria levantar
os olhos ao céu, mas batia no peito, dizendo: Ó Deus, tem misericórdia de mim,
que sou pecador! Digo-lhes que este foi justificado para sua casa, e não
aquele; porque qualquer que a si mesmo se exaltar, será humilhado e, qualquer
que a si mesmo se humilhar, será exaltado”. (Lucas 18:9-14)
O
fariseu dessa história é um exemplo-mor de mediocridade, pois ele olhava para o
mundo ao seu redor e se julgava superior a todos e, para ratificar sua
mediocridade, ele tentava fazer seu “pé-de-meia moral” diante de Deus, como se
Ele fosse manipulável por homens - mas a nossa realidade religiosa atual não é
diferente. Nós também, quase sempre, confiamos em nós mesmos, nos justificamos
conforme nossos próprios padrões e desprezamos os outros - ora, os outros são
mundanos, pervertidos, pecadores que matam, roubam, bebem, fumam, vão à balada,
usam tatuagem, gostam de “heavy metal” e não usam roupas decentes e nós, por
outro lado, somos santos, usamos vestes recatadas, não fumamos, nem bebemos,
vamos todo domingo à igreja, não ouvimos “música do mundo” nem mesmo “rock
gospel” e seguimos as tradições de nossa denominação. Vestimo-nos de
nosso personagem a cada ida à igreja e, quando voltamos pra casa, voltamos a
ser quem somos. Assim como os fariseus, temos nossos momentos de sepulcros
caiados – mas, se agora nos lembrarmos do que a Bíblia diz, saberemos
exatamente qual é a mensagem de Jesus a esse respeito (vide Mateus 23).
Em
tudo isso, o mais medíocre, em minha opinião, é o pensamento comum no meio
religioso (particularmente cristão) de que Deus se agrada primordialmente
naquilo que intencionamos fazer para Ele, visto que acreditamos que, se
intencionarmos fazer qualquer coisa para a glória de Deus, essa atitude
automaticamente glorificará a Deus e, consequentemente, Ele se agradará de
nossa conduta. Embora eu acredite, sem
qualquer sombra de dúvida, de que tudo que eu faço (seja comer, beber, ver um
filme, jogar futebol, estudar química orgânica, ouvir blues, conversar sobre
filosofia, namorar, viajar para outro país ou outra coisa qualquer) pode e deve
ser feito para a glória de Deus – ver 1 Coríntios 10:31 -, não faz o menor
sentido dizer que a glória de Deus está subordinada às minhas intenções. Como
já escrevi em outro texto, a glória de Deus deve determinar o que eu devo
intencionar fazer ou não fazer, e não o inverso. Porém, os medíocres (como
eu) pensam que podem encaixotar Deus por se julgarem bons, justos, mais
íntegros e “mais santos” do que os demais. Com o perdão da gíria, nós
somos realmente muito idiotas, na moral!
Entretanto,
na contramão da mediocridade surge o publicano, o qual, por um lado, também era
medíocre (ele mesmo se vê como pecador) mas, por outro, ele tem a atitude
correta: ELE RECONHECEU QUE ERA MEDÍOCRE. Mais do que isso: o reconhecimento por parte dele foi tal
que ele se julgava indigno de olhar para o céu – o que pode ser
considerado, em sentido conotativo, como uma atitude de temor sincero de Deus e
humilhação – e, por ver a sua situação
de real desespero, batia no peito e clamava por compaixão [diferente de
nós, que batemos no peito inflados de orgulho e autossuficiência]. Ele grita
para Deus: “Tem misericórdia de mim, que sou pecador!” [Lucas 18, vs. 13] e, de
um modo sublime e inspirador, Jesus diz que este homem foi justificado para sua
casa (enquanto o fariseu continuou injusto diante de Deus) porque “...todo
aquele que a si mesmo se exaltar será humilhado e todo aquele que se humilhar
será exaltado...” [Lucas 18, vs. 14]. Que
lindo! Os humildes são exaltados, os que se vêem como nada são cobertos de
dignidade, os que reconhecem que são totalmente injustos por si mesmos são
declarados justos. Como diz certa música: “...isso é a Graça e nada posso
fazer...”. Nada, nem mais nem menos. Ele fez tudo que devia ser feito - Romanos
3:23-28.
Finalmente,
a melhor forma de encerrar esse texto é citar uma linda música, na qual o poeta
reconhece sua própria mediocridade e diz:
“Eu canto pra
Ti... Sei onde estou... Olhando pra mim posso saber que nada sou... Eu grito
pra Ti, ó Deus, vem me socorrer... Olhando pra mim posso saber que nada posso
fazer...”
Exatamente
isso.
Pela
consciência de minha mediocridade e de Sua sublimidade,
Soli Deo Gloria!
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