O ano ainda não terminou e, finalmente, consegui ter tempo para vir aqui.
Logo, antes que o ano acabe - e que eu precise atualizar algumas configurações operacionais deste computador -, vou tentar expor algumas reflexões relacionadas às minhas últimas semanas e que, queira Deus, sejam úteis a quem vier lê-las.
O tema desse texto é uma pergunta provocativa referente a um tema que tem me inquietado há um bom tempo - sobretudo por perceber, ao olhar dentro de mim mesmo, que não sou o "exemplo perfeito" dessa "paixão pela pureza". Todavia, antes de irmos ao clímax ou ao epicentro dessa postagem, vamos definir algumas coisas.
Paixão.
Não creio haver definição mais oportuna a respeito de "paixão" do que aquela encontrada nas clássicas "10 categorias do ser" de Aristóteles [as quais conheci por causa do contato com as Artes Liberais do Trivium], na qual vemos que "paixão" consiste no "sofrimento de uma ação" ou na "condição daquele que é alvo de um movimento externo". Desse modo, pode-se acrescentar também a noção de paixão presente no Cristianismo [a qual lhe é central, visto que se refere ao episódio da morte de Jesus Cristo], posto que está diretamente ligada ao "sofrimento" ou à "enfermidade" carregados pelo Filho de Deus, de tal sorte que o termo grego "pathos" e o verbo italiano "patire" possuem uma raiz comum e são correspondentes ao "padecer" na língua portuguesa. No mais, sabemos que os termos médicos/psicológicos terminados em "-patia" também podem ser associados aos mesmos vocábulos anteriores.
Nesse ínterim, deve-se destacar que a paixão é algo que está sendo supervalorizado [ou mesmo deificado/divinizado] em nossos dias. Como resultado, o que mais se pode ver são frases de efeito ou declarações motivacionais dos tipos "nunca desista de seus sonhos", "siga o seu coração", "não vale a pena continuar se não há mais paixão" ou até "se apaixone por você mesmo e, então, veja se pode se apaixonar por alguém". Obviamente, a paixão em si mesma não é, necessariamente, algo ruim [como posteriormente pretendo esclarecer melhor]; todavia, desde que os ideais românticos e sentimentalistas tomaram conta de (quase) tudo e de (quase) todos os seres humanos que vivem neste planeta, a paixão por si só se tornou o critério principal (quiçá único) pelo qual todas as questões da vida e da realidade são avaliadas e, desse modo, todas as decisões tendem a ser tomadas tendo em vista a satisfação dessas "paixões" e a minimização de todo e qualquer desapontamento [por menor que seja]. Resumidamente, o que quero dizer é que, na mentalidade do mundo atual [talvez mais intensamente que outrora], é a paixão que passa a definir o que é certo e o que deve ser adotado para a vida e não o contrário - i.e., não é mais a verdade nem o que é bom que determina onde devem estar nossas paixões e afeições, e sim os sentimentos e impulsos passionais humanos que redefinem o que é bom, justo e verdadeiro.
Pureza.
De maneira mais simples, pureza é a qualidade do que é puro, sem mistura, ou o que não é híbrido ou adulterado, mas sim imaculado ou mesmo santo. Em muitos sentidos, essa é uma palavra que se tornou uma das mais repulsivas às gerações recentes, visto que é normalmente vinculada a um modo de pensar/viver "retrógrado", "fundamentalista" e conservador - em outras palavras, é um termo cristão e, tão-somente por isso, já deve ser odiado e esvaziado de seu real significado. Ora, como a "nouvelle vague" do momento é o "progresso", a práxis social subseqüente é que, de tudo o que existe, quase nada deve ser "conservado" ou mantido "puro" mas, pelo contrário, é necessário remodelar ou desconstruir todas as coisas em todas as partes, pois só assim superaremos todos os males decorrentes de uma civilização repressiva e que nos impediu de desenvolver as reais "potencialidades" humanas, das quais a mais importante e venerada delas é a do "Coach Boticário": "você pode ser o que quiser".
Não obstante, é necessário reconhecer que, por outro lado, há um terrível problema que precisa ser abordado com toda a seriedade que nos for possível: o que eu vou chamar aqui de "ostentação vaidosa da pureza". O que isso significaria, então?
Do ponto de vista social e cultural, eu tenho sido um tipo de testemunha ocular de um fenômeno bastante louvável e positivo entre os de minha geração: o interesse dedicado e genuíno pelas coisas boas e virtuosas produzidas pela humanidade, sejam as que estão como que "eternizadas" após séculos [como os vitrais das catedrais góticas européias ou as epopéias dos povos do Oriente Médio ou dos gregos] ou algumas mais modernas [como os livros de autores como Roger Scruton, Theodore Dalrymple e T. S. Elliot]. É evidente que, numa época em que o fato de um policial usar o seu cassetete em uma abordagem causa mais indignação do que a existência dos lamentáveis "paredões" [que nada mais são do que uma evidência da corrupção moral e da degeneração estética de uma geração inteira de jovens que perderam o senso da beleza e da própria dignidade], é mais do que um alento perceber que nem todos estão sendo arrastados pelas correntezas da vulgaridade e do amor pelo que é feio e grotesco. Porém, ainda existe um outro mal, mais sutil, o qual não advém das coisas virtuosas supracitadas, mas sim é inerente a nós mesmos: a soberba que provém da comparação com os que nos são semelhantes. Nesse contexto, auspiciosas nos são as palavras do sábio: "...antes da ruína vem a soberba, e a altivez de espirito precede a queda..." [Provérbios 16, vs. 18]
Antes de ir para o assunto principal do texto, quero somente esclarecer que as coisas de nosso mundo real não são totalmente iguais entre si [e não devem ser, bem como jamais serão!], de tal modo que existem coisas que são boas, dignas de apreciação e que possuem valor intrínseco [como a música de Bach, a poesia de Shakespeare ou a ciência produzida por homens como Kepler e Pasteur] e outras que são em si inferiores ou mesmo abomináveis [a exemplo da música eletrônica que é útil nas horas de academia e, no último caso, as cartilhas de organismos internacionais que promovem o infanticídio/aborto em nome da "saúde pública" e do "direito feminino sobre o corpo"]. No entanto, o orgulho humano é um tipo de mal [ou mais precisamente, de pecado] que, nas palavras de Benjamin Franklin, é tão difícil de ser subjugado que, "quando tivermos a forte impressão de que já o vencemos, provavelmente nos orgulharíamos de nossa humildade". Portanto, o que gostaria de salientar é que a maior tentação/armadilha que aqueles que procuram buscar as coisas excelentes da vida [seja culturalmente, seja espiritualmente - ainda que cultura e espiritualidade sejam inseparáveis] deverão enfrentar é a da "vaidade velada" ou da "ostentação vaidosa da pureza", pela qual se começa a confiar demasiadamente em si mesmo e na própria sabedoria [tanto teórica quanto prática]. Consequentemente, os que caem nesse tipo de auto-engano passam a desprezar os outros [algumas vezes, muito superiores a eles] ao ponto de que, por causa desse "conhecimento superior" - numa espécie de "gnosticismo pós-moderno" -, se julgam acima dos males que se espalham pela "sociedade sem erudição ou sem precisão doutrinária" e, por isso, se fazem juízes dos que "não pensam como eles" ou "não lêem os livros que eles lêem" e, finalmente, os condenam ao próprio inferno. Diante disso, nada melhor do que algumas das palavras mais assustadoras escritas pelo apóstolo Paulo, onde se lê:
Por isso, você é indesculpável quando julga os outros, não importando quem você é. Pois, naquilo em que julga o outro, você está condenando a si mesmo, porque pratica as mesmas coisas que condena.
Bem sabemos que o juízo de Deus é segundo a verdade contra os que praticam essas coisas.
E você, que condena os que praticam tais coisas, mas faz o mesmo que eles fazem, pensa que conseguirá se livrar do juízo de Deus? [Romanos 2, vs. 1-3]
Considerando que, num texto anterior que escrevi (creio que no início de 2018), eu fiz uma crítica mais direta a esse tipo de vaidade em referência aos novos "intelectuais salvadores da civilização ocidental" - falo como um brasileiro que ama as minhas raízes civilizacionais e que deseja que essas coisas sejam resgatadas na medida do possível -, dessa vez a razão que me levou a escrever esse texto é ainda mais lamentável. A situação é aquela do tipo "eu não gostaria de ter que escrever sobre isso, mas não há escolha". Que Deus me ajude!
No mês passado, eu participei de um evento cristão em minha cidade como voluntário [especificamente na área de literatura e venda de livros] e, no primeiro dia de programações, durante um momento em que estava indicando um determinado livro para alguns visitantes do stand, eu fiz a seguinte recomendação:
"Pelo que ouvi falar deste livro [no caso, "A vida de Deus na alma do homem"], a leitura dele foi determinante para a conversão de John Wesley, um dos maiores pregadores/evangelistas da história do Cristianismo protestante".
Imediatamente, alguém que estava naquele grupo de pessoas olhando os livros disse: "...isso não faz diferença, porque o John Wesley não era cristão. Se ele não acreditava nas 'doutrinas certas', ele não era convertido e eu não o considero irmão de fé...". Diante de tal declaração infeliz, eu procurei controlar meus ímpetos, mas tentei deixar muito claro para aquela pessoa [no caso, era um jovem rapaz seminarista - se não estou enganado, de uma igreja de linha reformada mais "puritana"] que é somente Deus "...que conhece os que Lhe pertencem..." [2 Timóteo 2, vs. 19, citação de Números 16, vs. 5], de modo que nenhum de nós deve ter a ousadia de usurpar o lugar que é exclusivamente Dele a fim de definir "quem é e quem não é convertido", i.e., "quem é salvo e quem não é". Após alguns curtos minutos na busca de apaziguar a discussão [embora nada sério tenha ocorrido], eu percebi que não haveria proveito em continuar e fui atender outras pessoas que estavam chegando para ver mais livros. A partir desse momento, eu não mais encontrei o rapaz mas espero, sinceramente, que os momentos em que passamos ouvindo canções que destacavam a grandeza de Deus e de Seus feitos bem como pregações fielmente baseadas na Bíblia tenham produzido frutos nele - e também nos demais [incluindo a mim mesmo] que lá estiveram.
Vale ressaltar que, nesse dia, havíamos acabado de ouvir uma pregação baseada no versículo "...bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus..." [Mateus 5, vs. 3]! Será mesmo que alguém que reage dessa forma é humilde nos termos indicados pelo próprio Cristo? E se não o é, do que adianta então "ter as doutrinas certas" na mente quando o coração parece continuar mais sujo que os sepulcros caiados citados por Jesus em sua mensagem contra os fariseus? Em suma, episódios como esse apenas ratificam o fato de que o pecado é algo tão sorrateiro, traiçoeiro, vil e destruidor que, até mesmo quando achamos que estamos sendo o melhor exemplo de "paixão pela pureza" - particularmente, a "paixão pela pureza doutrinária" - a nossa "piedade" não passa de uma "piedade ímpia", a qual causa asco no Deus que achamos que estamos impressionando. As Escrituras são claras em condenar a "espiritualidade dissimulada" quando dizem "...este povo me honra com os lábios, mas o seu coração está longe de mim..." [Isaías 29, vs. 13] e chegam a dizer que os próprios demônios "crêem que há um só Deus e estremecem..." [Tiago 2, vs. 19] - logo, que vantagem haveria em tão-somente conhecer corretamente as coisas a respeito de Deus sem que isso mude o nosso ser por inteiro? Se não tememos [nem trememos] quando exercemos juízo temerário sobre alguém [visto que "...com a medida com que julgarmos, seremos também julgados..." - Mateus 7, vs. 2], será que este não seria um estado mais miserável do que o dos próprios demônios?
Ora, a minha pergunta é [falo aos cristãos inicialmente, e aos demais leitores por consequência]: por qual pureza devemos ser apaixonados? A pureza de quem deve ser o alvo de nossa inspiração?
Inicialmente, quero apenas fazer algumas considerações que julgo ser importantes. Ora, é fundamental compreendermos que, sem o correto conhecimento de Deus [conforme revelado nas Escrituras de modo especial], não é possível experimentar uma experiência/relação genuína com Ele pois, onde não há esse tipo de conhecimento, nossa tendência sempre será "inventar um deus conforme nossa própria imagem e semelhança". Nesse sentido, eu tenho discordâncias com a teologia adotada por John Wesley [especialmente no tocante às questões referentes à predestinação], contudo não posso sequer me comparar a ele nos quesitos "consagração a Deus", "vida de oração", "fervor evangelístico" e "amor pelo próximo", cujas características são conjuntamente evidências de uma vida verdadeiramente transformada pelo Evangelho e onde há o "fruto do Espírito" [vide Gálatas 5:22-23]. Portanto, nunca ousei e pretendo jamais ousar questionar a sua idoneidade como cristão e, embora tenha diferenças doutrinárias em relação a ele [e aos seus seguidores], eu o chamo e continuarei a chamá-lo de irmão. Quisera Deus, por Sua graça, me conceder o mínimo da devoção de Wesley e de seus amigos do "Clube Santo" de Oxford - talvez assim o meu campus não seria uma "Nova Babilônia".
Nesse caso, se a salvação de alguém é dependente de "precisão teológica" ou de uma "adequação doutrinária" por parte da mente e do discurso, eu apenas precisaria ler tratados de teologia sistemática puritana, decorar os 4 volumes das Institutas da Religião Cristã [nada contra as Institutas em si - elas são uma obra brilhante e fiel às Escrituras] e seguir todo o Diretório de Culto de Westminster [não pretendo com essa menção desrespeitar a boa tradição do puritanismo britânico, a qual é muito cara aos meus irmãos presbiterianos!] para ser livrado da condenação eterna. Em outras palavras, eu seria o meu próprio salvador mas permaneceria iludido achando que minha confiança estaria em Jesus Cristo e em Sua obra - ora, qual teologia poderia ser mais bíblica do que a minha? De fato, talvez esse seja o meio mais eficaz pelo qual o diabo, com suas astutas ciladas, pode e tem conseguido enganar alguns religiosos que, enquanto se apegam ao que eles mesmos constroem em seu intelecto a respeito de Deus com base em suas muitas leituras, igualmente se esquecem de que a salvação é uma obra exclusiva de Deus - ou melhor, é um ato "monergístico", termo que é mais "chique" [do jeito que esses "reformodinhas" gostam!], embora seja, ao mesmo tempo, factualmente verdadeiro.
Finalmente, chegou o momento de responder à pergunta principal do texto: qual é a pureza que deve ser o alvo de nossa paixão? A que [o a quem] ela pertence?
No tocante ao tipo de pureza em questão [i.e., pureza espiritual], todo raciocínio deve começar do seguinte ponto: todos somos impuros. É bastante comum que, ao nos compararmos com outras pessoas, possamos nos sentir superiores a elas [especialmente no tocante à moral] - ora, eu mesmo poderia dizer que, de certa maneira, eu sou uma pessoa muito "melhor" do que a que Mao Tsé-Tung foi, uma vez que não tenho na minha conta um genocídio populacional de dezenas de milhões de pessoas num espaço de menos de 30 anos. Entretanto, a referência com a qual todos nós, sem exceção, devemos nos comparar, não são aqueles que dentre nós foram os mais perversos [ao menos na prática], mas sim Aquele que é chamado de "Santo, Santo, Santo" por seres celestiais sem pecado e que, mesmo nesse estado glorioso, temem olhar diretamente para esse "Santo" ao cobrirem os seus rostos ou se prostrarem diante Dele. Sem rodeios, quando se trata de "pureza", somente Deus está em condições de exibir/exigir prerrogativas, pois está escrito que "...todos nós somos como o imundo, e todos os nossos atos de justiça são como trapos de imundícia..." [Isaías 64, vs. 6] ao passo que Ele "...é tão puro de olhos que não pode suportar o mal..." [Habacuque 1, vs. 13] bem como que "...Deus é fidelidade, e Nele não há injustiça; é justo e reto..." [Deuteronômio 32, vs. 4]. Eu poderia procurar diversas outras passagens da Bíblia para reforçar o meu argumento, mas creio ser suficiente nos atentarmos cuidadosamente aos textos apresentados, como nas palavras do saudoso R. C. Sproul: "God is holy, but I am not" ou "Deus é santo, mas eu não sou".
Além disso, ao considerarmos essa "pureza", é fundamental relembrar que, antes do pecado original, o ser humano [assim como a criação como um todo] era "muito boa" - vide Gênesis 1, vs. 31 -, de sorte que tudo o que Deus havia feito era sem pecado, embora distinto Dele próprio quanto à Sua plenitude. Nesse sentido, nós só poderíamos continuar nessa "condição de pureza" se não houvéssemos sido rebeldes à autoridade divina mas, como os primeiros seres humanos criados deliberadamente desobedeceram a Deus e, assim, foram destituídos de Sua glória, a nossa participação ou comunhão com Deus foi radicalmente rompida. Como resultado, nos separamos da nossa única e real "fonte de pureza" - mais do que isso, nos tornamos odiosos em relação a tudo o que é santo e, até esse momento, pode-se ver que, à parte da graça de Deus, todos somos "apaixonados pela impureza" e vivemos de acordo com essa paixão.
Isto posto, como é possível despertar em nós a paixão pela verdadeira pureza?
Primeiramente, nenhum de nós pode/poderia/poderá produzir tal paixão por si só, pois o pecado afeta a natureza humana em todos os seus domínios - a vontade, as afeições, o intelecto e mesmo o próprio corpo. Doravante, como todos nós estamos sob essa condição caída e em rebelião contra Deus, estamos semelhantemente sob o Seu juízo [como citado em parágrafos anteriores], de modo que necessitamos de algo que nos livre de tal condenação - mais precisamente, precisamos de Alguém que seja como nós (para ser nosso substituto quanto à punição devida ao nosso pecado) e que seja também como Deus (para que, assim, possa efetivamente ser o Salvador daqueles a quem representa). Isto é, precisamos de Jesus Cristo.
Nós ainda estamos na "estação do Natal" - conforme o calendário litúrgico - e nada poderia ser mais oportuno do que falarmos a respeito de Jesus Cristo. Não há ninguém na história tão importante e "divisor de águas" quanto o Rei que se fez menino e que foi adorado até por astrólogos (os magos do Oriente eram provavelmente estudiosos de astrologia/astronomia e ligados ao Zoroastrismo persa) ao nascer na pequena vila de Belém, o Senhor que encarnou para ser o Servo Sofredor, o Deus que se esvaziou para assumir a nossa humilhada forma humana, o Eterno que "se limitou" ao entrar no tempo, o Criador que precisou ser acolhido nos braços da mãe que Ele mesmo criara, o Todo-poderoso que veio ao mundo para dar a Sua vida voluntariamente, o Descendente prometido que, nascido de mulher e sob a Lei, se manifestou para redimir os que estavam debaixo da Lei para que esses redimidos fossem adotados como filhos de Seu Pai celestial e, assim, fossem feitos herdeiros Dele.
Reflitamos um pouco sobre a sublime maravilha do Natal: Deus nasceu! Será que realmente paramos tempo suficiente para meditar no que isso realmente significa? Muitos de nós até perdem tempo com discussões inúteis e infundadas sobre uma "possível origem pagã" do Natal bem como de seus símbolos [como a árvore e seus adereços], todavia são raros aqueles que, ao ouvirem a cada fim de ano que o Natal é a comemoração do nascimento de Jesus Cristo [ou de seu "aniversário", como é comum de se ouvir], são conduzidos ao encanto que deve advir da percepção da grandeza desse acontecimento - Deus estava vindo ao mundo na forma de um bebê, Aquele que "nem os céus dos céus podem conter" saiu de Sua glória e "coube" dentro do ventre de uma virgem. Como, então, não entender a reação de Isabel ao ouvir a saudação de Maria quando João Batista, ainda no ventre, se alegrou com a visita daquela que seria "a mãe de seu Senhor"? Como não exultar juntamente com os anjos que, diante dos pastores no campo, cantaram "...glória a Deus nas alturas, e paz na terra entre os homens a quem Ele quer bem..." [Lucas 2, vs. 14]? Creio que um bom resumo de tudo isso se dá mediante os primeiros versos do Benedictus [Cântico de Zacarias], onde se lê:
Bendito seja o Senhor, Deus de Israel, pois que visitou e redimiu o Seu povo.
[Lucas 1, vs. 68]
Dessa maneira, o Natal é algo glorioso não somente pelo que o caracteriza em si, mas igualmente pela sua finalidade: Deus precisou "nascer" para posteriormente "morrer", pois ninguém poderia ser redimido por Ele sem que Ele oferecesse um sacrifício à altura de nossa necessidade. Na verdade, a obra redentora de Deus em favor dos homens pecadores [e da criação inteira, por extensão] começou desde a Encarnação, o único momento da história em que foi gerado um ente genuinamente puro e santo. No entanto, a "pureza de Jesus Cristo" não foi parte de Sua vida apenas nos seus primeiros anos [p. ex., pelo fato de ele ser, naquele momento, uma "criança inocente"] ou mesmo até os Seus doze anos [idade na qual há relatos nas Escrituras de Seus debates com os mestres de Lei bem como de Sua sabedoria incomum], mas Ele foi santo em todo Seu proceder, de sorte que "...nele não se achou pecado, nem foi encontrado engano em Sua boca..." [1 Pedro 2, vs. 22] e que Ele "...achado em forma humana, humilhou-se a Si mesmo, sendo obediente até a morte..." [Filipenses 2, vs. 8]. Em outras palavras, Jesus Cristo foi o único homem que, verdadeiramente, viveu uma vida de "paixão pela pureza" - o que nada mais é do que o Seu amor e devoção à vontade do Pai - e, conseqüentemente, a única pureza pela qual devemos ser apaixonados é a pureza de Cristo, uma vez que toda e qualquer suposta pureza que não seja a Dele não é nada além de iniquidade mascarada.
Mas eis então a "boa-nova" do Evangelho [aqui vale o pleonasmo]: a pureza de Cristo pode ser contada como se fosse nossa, se nos arrependermos de nossos pecados e crermos em Seu nome. Ou seja, todo e qualquer pecador, por mais impuro que seja, sempre poderá achar em Cristo mais misericórdia do que a medida de seus pecados, de modo que se crermos que "Deus enviou o Seu Filho ao mundo para que o mundo fosse salvo por Ele" [João 3, vs. 17] - i.e., se entendermos e nos dermos conta do real sentido do Natal -, a justiça de Cristo é creditada em nosso favor e o nosso pecado é lançado sobre Ele. Nossa "pureza teológica" não importa; nosso "virtuosismo intelectual" também não; somente Cristo importa. A Cruz é o lugar onde todos não têm qualquer opção a não ser a humilhação, "o total desprezo de si mesmo" [nas palavras de Tomás de Kempis] e a adoração exclusiva ao "Cordeiro que foi morto, mas que ressuscitou e que vive pelos séculos dos séculos" [Apocalipse 1, vs. 18].
Como temos lidado com a paixão e com nossas "paixões"?
Temos superestimado [em lugar de subjugar] aquilo que normalmente nos leva ao engano e a praticar os piores pecados?
Quais têm sido as nossas principais paixões? As coisas temporais ou as coisas eternas?
Por qual "pureza" temos nos apaixonado? A pureza do "intelecto refinado", a da "precisão hermenêutico-doutrinária" ou a pureza de Jesus Cristo - o Único realmente puro?
E, se já estamos cientes do que Cristo fez por nós ao nascer para posteriormente dar Sua vida, até quando continuaremos adiando a nossa resposta a esse amor?
Porque não nos arrependermos de nossa vida impura para nos apropriarmos da pureza Dele?
Pela alegria de ser participante da pureza Dele,
Soli Deo Gloria!
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