Após uma publicação mais branda e poética, creio que é hora de fazer novamente o que me apetece: lançar minha indignação por escrito, visto que não posso lançá-la sobre quem tenho vontade. Logo, mãos à obra - e que meu computador me ajude!
Seguindo um modelo que, por vezes, aparece por aqui, esse texto será baseado numa música da Legião Urbana chamada "Há Tempos" (em particular, num dos seus diversos trechos que podem instilar reflexões em qualquer um que conceda a devida atenção à letra), de forma a relacionar o conteúdo da música, o momento atual do país e a recordação de mais um 31 de outubro - o Dia da Reforma Protestante. Os versos em questão dizem:
"...E há tempos nem os 'santos' / Têm ao certo a medida da maldade..."
A pergunta que pretendo responder aqui é: qual a relação de tais versos (e da canção como um todo) com a realidade recente do Brasil e a Reforma Protestante? Leia até o fim e descubra!
Os santos e a maldade.
Pode-se definir "santo" como 1) "aquilo que não possui mácula ou contaminação" (i.e., no sentido de algo puro) ou, em termos mais religiosos, 2) "santo" é tanto uma designação conferida a alguém cuja vida é reconhecida como "exemplo de devoção" - o que é mais comum nas tradições católico-romana, cristã ortodoxa, copta etc. - quanto 3) "algo/alguém que foi separado de uma condição ordinária/comum para um uso específico e superior". Portanto, quando se utiliza a palavra "santo" ou "santos" para qualificar coisas ou pessoas, o que normalmente se tem em mente é que aquela coisa/pessoa é 1/2) considerada sem defeito, possui um tipo de "dignidade espiritual" ou é irrepreensível bem como que 3) essa coisa/pessoa foi dedicada/consagrada para um fim religioso ou divino. Mais particularmente, esse(s) vocábulo(s) é/são característico(s) das religiões monoteístas (Judaísmo, Islamismo e, notadamente, o Cristianismo) e, dessa maneira, o texto estará restrito ao contexto cristão e, por isso, será dirigido diretamente aos cristãos - embora, talvez, possa ser útil a qualquer leitor mais benevolente.
Por outro lado, "maldade" é 1) o 'atributo próprio de quem é mau ou perverso' ou 2) 'aquilo que é em si mesmo leviano, doloso e intencionalmente contrário ao que é bom e justo". Portanto, para se falar apropriadamente em 'maldade', é imprescindível que haja um referencial absoluto de "bondade" que sirva de fundamento para a correta compreensão dessa realidade. Conseqüentemente, se todos dentre nós, até mesmo os mais excêntricos e relativistas, sabem na prática o que é a maldade e se lhe opõem quando são por ela atingidos (ou quando assim o sentem), a conclusão mais razoável é que, indubitavelmente, tal 'referencial de bondade' existe - ainda que uma grande parte de nós não seja corajosa e suficientemente humilde para admitir isso.
Ditas essas coisas, o que seria a "medida da maldade" da qual os "santos" estariam desprovidos?
Nas chamadas "ciências exatas" (p. ex., matemática, física, química etc.), bem como nas engenharias ou nas "ciências econômicas", o conceito de "medida" é basilar e recorrente - seja em cálculos de Geometria Plana (Euclidiana), na caracterização de grandezas vetoriais, em Estequiometria de Reações, na otimização operacional de uma plataforma petrolífera ou no ajuste do 'Orçamento Geral da União'. Nesse sentido, a existência de instrumentos adequados e/ou de equações e formulações matemáticas apropriadas é fundamental para que as "medidas" correspondam à realidade observada ou ao alvo desejado. De modo análogo, para que possamos compreender corretamente as realidades social, política, cultural e espiritual nas quais estamos, também é necessário possuirmos as devidas ferramentas que nos possibilitem adquirir o conhecimento dessas realidades, pois, caso não as tenhamos, seremos parte de um dos mais graves problemas de nossa geração: a falta do correto "senso das proporções" no trato com o todo da realidade e suas diferentes esferas.
A esse respeito, poder-se-ia definir como "senso de proporções" a "percepção adequada do valor e/ou gravidade relativos de dois ou mais entes/elementos presentes na realidade em que se está inserido" ou, de forma mais simples, seria a "capacidade de avaliar com precisão as diversas situações com as quais lidamos, de tal modo a reagir de acordo com a natureza delas". Por exemplo, se um pai vê seu filho de 5 anos desobedecendo à mãe quanto a alguma ajuda doméstica, a atitude proporcional desse pai deve ser corrigir o filho e guiá-lo à obediência (sendo até mais duro, se necessário) mas, se esse mesmo filho, agora com 18 anos, está armado e ameaça matar a própria mãe, a única reação proporcionalmente apropriada é usar de toda a força necessária para impedir que o filho cometa um crime - incluso o direito de usar uma bela "Winchester 22" em legítima defesa! Logo, se em certo sentido toda morte é algo ruim, o que seria mais hediondo: a possível morte de um meliante capaz de atentar contra a própria mãe ou a morte de uma mãe inocente nas mãos de um filho inescrupuloso? A resposta é óbvia mas, visto que em nosso mundo o óbvio não é somente ofensivo (mas igualmente inacessível!), deve-se ratificar que a 'morte da mãe' é o mal a ser impedido a todo custo - a não ser para quem gosta de bandidos (como a tal de Deolane, a "advogada" amiguinha do Lula) ou já é um deles (a exemplo do próprio Lula e dos membros de sua organização criminosa disfarçada de partido político).
Falando nisso... será que, depois desse parágrafo, eu serei intimado pelo TSE? Aguardemos.
É preciso admitir que, infelizmente, a perda do "senso das proporções" tem caracterizado cada segmento da sociedade, de modo que os próprios ambientes cristãos (e, particularmente, o meio protestante) foram atingidos por este grande mal - e isso para vergonha minha. No entanto, como pode ser razoável que os que professam seguir Aquele "em Quem todos os tesouros da sabedoria e da ciência estão escondidos" (Colossenses 2, vs. 3) e que "dá sabedoria a todo o que Lhe pede, sem lançar em rosto" (Tiago 1, vs. 5) pensem e se comportem de forma irrefletida - ou mesmo estúpida?
É exatamente aqui, nessa resposta, que a canção mencionada, a realidade recente do Brasil e a Reforma Protestante se encontram. Vamos adiante!
Há pouco mais de 500 anos (precisamente, há 505 anos, no dia 31/10/1517), ocorreu o episódio que se tornou o marco inicial da Reforma Protestante: a publicação das famosas "95 Teses" por Martinho Lutero na porta da Igreja do Castelo (Schlosskirche) em Wittenberg/Alemanha. Embora o ambiente que possibilitou a eclosão da Reforma já estivesse sendo preparado desde os séculos XIV e XV, foi apenas no séc. XVI que o movimento protestante se consolidou, visto que a Igreja Romana reagiu com veemência e hostilidade à iniciativa de Lutero quanto a uma "reforma espiritual interna" (como era seu desejo) e, como resultado, aqueles que estavam "protestando" em favor dessas mudanças ficariam conhecidos como "protestantes" a partir de 1529-1530. Nesse sentido, vale salientar que um dos principais legados da Reforma foi o resgate da supremacia das Sagradas Escrituras (em contraste com a Tradição e a própria Igreja) como a "regra de fé e prática" suficiente e a autoridade última para o cristão, cujos desdobramentos transformariam para sempre a 'Civilização Ocidental' e, conseqüentemente, outras partes do mundo. Logo, dentre tantos conceitos, princípios e/ou doutrinas restauradas pelos reformadores, um(a) é absolutamente indispensável para entendermos porque "há tempos nem os santos têm ao certo a medida da maldade": a depravação total ou corrupção radical.
A doutrina da "depravação total" (ou corrupção radical) define que, com a entrada do pecado no mundo a partir da desobediência de Adão e Eva, todos nós fomos feitos pecadores ou "nos solidarizamos com o primeiro casal" em seu estado de queda e ruína [Romanos 5, vs. 12]. Desse modo, o pecado deles também é "nosso" e, em decorrência disso, tanto a culpa e a maldição lançadas sobre Adão como a subseqüente corrupção da natureza humana tornaram-se nossa "herança". Tal herança não significa, porém, que nós somos tão maus quanto poderíamos ser (na prática), mas que todas as dimensões e faculdades humanas estão terrivelmente golpeadas pelo pecado, a ponto de que, sem a intervenção de Deus, ninguém pode sequer dar-se conta da real extensão dos seus efeitos hediondos - seja em si mesmo, seja ao seu redor. Assim, lançando mão de somente alguns breves trechos das Escrituras, podemos entender que "...o homem é impuro e corrupto, e bebe iniquidade como água..." [Jó 15, vs. 16] bem como que "...não há nenhum justo, nem um sequer... não há quem entenda ou busque a Deus, nem ninguém que faça o bem..." [Romanos 3, vs. 10-12]. Isto é, ainda que sejamos imagem e semelhança de Deus, o estrago que o pecado nos infligiu é sobremodo horrível e humanamente irreversível.
Como, então, essa doutrina pode ser útil para a compreensão do momento atual do Brasil e, em particular, da comunidade cristã/evangélica brasileira?
Primeiramente, devo reconhecer que o problema mais urgente e delicado do meio protestante/evangélico nacional é o "analfabetismo bíblico" resultante da ausência de uma pregação fiel e ousada (associada a um testemunho firme e vibrante), o que tem produzido uma forma de cristianismo "insípida", "débil", "acovardada" e "conformada com o mundo". Na outra face da mesma moeda, pode-se destacar outro tipo de analfabetismo (a saber, o funcional), o qual decorre de um processo longo e articulado de "subversão psicológica e engenharia social", planejado e aplicado de maneira massificada e intencional no mundo (especialmente no Ocidente) exatamente para atingir os fins citados, a saber: 1) a perversão do imaginário e da própria capacidade de raciocinar logicamente e, simultaneamente, 2) remodelar a sociedade de tal maneira que o processo de revolução não possa ser posteriormente revertido (ou mesmo percebido). De fato, não há descrição melhor para tal fenômeno que aquela feita por um de seus maiores proponentes (o filósofo italiano Antonio Gramsci): "um poder onipresente e invisível, tal qual um imperativo divino".
Dessarte, conclui-se que a) a deficiência de conhecimento bíblico adequado implica o alto índice de ignorância com respeito ao conhecimento de nós mesmos e da nossa pecaminosidade e b) o próprio êxito da subversão social supracitada evidencia que a "depravação total" é uma verdade incontestável, posto que sinaliza quão facilmente somos corrompidos em nossos pensamentos e visões acerca da realidade e, inevitavelmente, desencaminhados em nossa conduta.
Sendo mais direto, "nunca antes na história desse país" - conforme o bordão de certo "descondenado" que deveria estar em prisão perpétua... (agora sim, sem dúvida, eu serei censurado pelos "editores do Brasil" ou cancelado por militantes histéricos e até pelos "crentinos") - houve tanta exibição de falsa virtude, tanta exaltação à ignorância e à burrice, tanta canalhice "em nome da democracia" e, obviamente, o sepultamento do bom senso e da defesa da verdade sob o disfarce da "moderação" e da "superação das polarizações". Não é possível elencar de forma exaustiva as inúmeras razões históricas e filosóficas que ratificam o abismo moral e ético existente entre as duas correntes políticas representadas na "disputa eleitoral" (sic) em curso, mas o simples fato de que um dos lados está implementando a censura total (e até prévia) dos seus oponentes - a tal ponto que as verdades censuradas são classificadas como "desordem informacional" ou "manipulação discursiva" - deveria ser suficiente para que todo brasileiro com o mínimo de vergonha na cara se opusesse a qualquer tirania mascarada de "estado democrático de direito". Contudo, os últimos anos (de 2020 até aqui) estão servindo para provar, de modo notório, que a "sem-vergonhice" humana (sobretudo dos que chamo carinhosamente de "tutti crentinni"), diferentemente da minha paciência ou do meu cartão de crédito, não tem limites - mas, se você ainda discorda, você está errado.
Dentre os diversos absurdos que podem ser vistos por aí, alguns de que me lembro são 1) "vamos repetir: proibir a 'mentira' não é censura", 2) a "idolatria política" (i.e., o 'bolsonarismo') está tomando conta das igrejas", 3) "a igreja não é lugar para se falar de politica, pois o reino de Jesus não é desse mundo" e 4) "não precisamos nos preocupar com o futuro do país, pois Deus está no controle de todas as coisas". Espero ser capaz de, em poucas palavras, dar uma resposta bíblica e satisfatória a cada uma dessas falácias. Sigamos!
Com respeito à falácia 1, deve-se questionar: QUEM define o que é mentira e o que é censura? Para os que estão mais atentos aos movimentos políticos dos últimos 250-300 anos (em especial desde o início do séc. XX), não é novidade que os que desejam "mandar no mundo" (i.e., que querem usurpar o lugar de Deus, o Qual define como as coisas são) desejam igualmente "controlar a linguagem e a informação", de modo que a 'verdade' e a 'mentira' passam a ser tão-somente convenções que mudam conforme os interesses de quem dita as regras do jogo - isto é, "se você me incomoda e ameaça meus planos, você é antidemocrático e eu vou censurá-lo... mas é para defender a democracia!". No tocante à falácia 2, vale ressaltar que eu, como cristão, estou ciente da realidade da idolatria e, por isso, sei que todos somos vulneráveis a cairmos nela em determinado grau - ou seja, não importa em qual espectro político o cristão se situe, ele está sujeito a superestimar idéias ou figuras políticas ao ponto de pôr nelas a sua esperança. Contudo, o simples posicionamento favorável a um dos lados (e, em particular, ao atual presidente) não é, necessariamente, um ato de idolatria e, não obstante isso, sabe-se que o pensamento alinhado à esquerda tem sido hegemônico nas últimas décadas (até mesmo nas igrejas), de tal sorte que certos "dogmas ideológicos" foram elevados ao patamar de "doutrina" sem que houvesse qualquer contraponto (p. ex., o 'pacifismo desarmamentista' e a 'guerra à masculinidade/feminilidade' decorrente do feminismo). Trocando em miúdos, o argumento da "idolatria política" é o novo "não julgueis", usado por quem quer esconder sua ignorância e seu pecado sob os auspícios de uma falsa piedade - logo, quanto a estes, eu só quero distância, pois é isso que as Escrituras ensinam (2 Timóteo 3, vs. 5b).
Além disso, a falácia 3 pode ser refutada com base no fato de que, se "não há nenhum centímetro quadrado, em todos os domínios da existência humana, sobre os quais Cristo, que é Senhor de tudo, não diga: 'é Meu'", Ele também é, por direito, o Senhor sobre a política, de maneira que a) tanto os que recebem o encargo do poder civil devem exercê-lo como um serviço a Deus para coibir o mal e louvar o bem (Romanos 13, vs. 1-5) quanto 2) nenhum cristão tem o direito de pensar e agir politicamente fora da Palavra de Deus e de Sua autoridade (Romanos 6, vs. 16-18). Portanto, todo que se declara 'cristão' mas "interage na pólis" como um ateu (ou, no mínimo, um dualista que divide a vida em "secular' e "espiritual") precisa voltar a crer na Bíblia que leva consigo a cada domingo ou, mais que isso, precisa aprender a ler e a guardar o que leu. Finalmente, a falácia 4 está fundamentada numa idéia falsa da providência divina, segundo a qual as coisas "serão como devem ser" independentemente do que fizermos. É evidente que Deus é soberano e sempre realiza a Sua vontade, mas isso não significa que nossas ações (ou nossa omissão) não tenha(m) conseqüências - visto que Deus também age através de meios humanos e/ou naturais. Será que Deus não estaria no controle da Venezuela, da Argentina e da Colômbia, por exemplo? Todavia, qual é a situação atual desses países após suas escolhas políticas mais recentes? Por tudo isso, enquanto ainda é (aparentemente) possível escolhermos (se é que haja uma escolha que seja respeitada na 'republiqueta do TSE/STF') com sabedoria e o mínimo de sensatez, temos o dever de tomar a melhor decisão - pois, assim como aprendemos nos grandes dilemas da literatura, "não decidir já é decidir".
Após todas essas considerações, mediante as quais podemos observar diferentes evidências dos efeitos da "depravação total" (mais especificamente, do chamado "pecado remanescente"), a expectativa que permanece é: haveria alguma solução para essa "maldade" da qual, há tempos, nem os "santos" têm sido capazes de se livrar?
Em primeiro lugar, há uma justa preocupação por parte de uma parcela da comunidade cristã brasileira em não dar razões adicionais para que o nome de Deus seja ainda mais blasfemado entre os ímpios (Romanos 2, vs. 24), especialmente quanto à "politização partidária dos púlpitos" (que é bastante reprovável). No entanto, embora eu também me oponha tenazmente a qualquer espécie de "profanação" de nossos púlpitos (falo como protestante) para fins político-partidários, a ausência de um entendimento bíblico concernente ao testemunho cristão na esfera pública (o que requer, obrigatoriamente, a correta instrução das comunidades de fé a esse respeito) implica(rá) 1) a mistura inapropriada entre a igreja de Cristo e o "poder temporal" - como ocorreu na Igreja Romana Medieval, o que foi condenado pelos reformadores - ou 2) uma separação tal entre a Igreja e a pólis de forma que não haja mais voz profética na sociedade e, assim, o Estado se torne autônomo até constituir-se "divino", a exemplo do rei absolutista francês que disse "L'état c'est moi!" ou, adaptando à nossa realidade, "a democracia sou eu!". Ou seja, uma vez que vivemos num mundo caído e deteriorado pelo pecado, temos o dever de agir como instrumentos de Deus para que Ele, através de nós, restrinja o mal e promova o bem nas instâncias política e social, porém sem corromper a fé e a prática cristãs por motivos políticos.
Por outro lado, esse fenômeno de tentar "salvaguardar a igreja" das críticas e reprovações externas pode trazer consigo a idéia mentirosa de que a honra e a pureza dela dependem, em último grau, de nossos esforços para preservá-las. Veja bem, criatura (ou, como diz a professora Cíntia Chagas, "filho de Deus!..."): NÃO É VOCÊ, nem sou eu, nem ninguém que possui o poder de conservar a igreja santa e sem defeito, mas única e exclusivamente Jesus Cristo, que é o Senhor e Cabeça da Igreja, sendo igualmente o seu Salvador. Com que petulância, pois, podemos arrogar para nós tais méritos e prerrogativas? A partir de que momento passamos a crer que nossos textões, vídeos, reels, threads e/ou carrosséis de stories/status substituíram a Cristo e Sua obra como meios de santificação em favor da igreja (vide Efésios 5, vs. 25-27)? Serei claro: se o nosso maior afã ou obsessão tem sido tentar "salvar a igreja do descrédito e escárnio públicos" (por acreditarmos que ela, sem nós, sucumbirá(ia) diante de seus opositores), estaremos nos opondo ao próprio Cristo ao buscar assumir o lugar que pertence apenas a Ele - i.e., agiremos como "anticristos" enquanto julgamos estar servindo a Cristo. Vamos repetir para que não haja mais dúvidas: Jesus é o único Salvador da Igreja e, se sou parte dela, não é a igreja que precisa de mim para permanecer, mas eu que necessito de Cristo para permanecer nela e, acima de tudo, NEle.
Desse modo, conclui-se que a solução para "todos os santos que já não possuem a correta medida da maldade", cujos jovens "adoecem" juntamente com uma humanidade imersa em pecado, da qual "o encanto está cada vez mais ausente" e onde os "sorrisos enferrujados" apenas indicam a degeneração escondida nos corações é a mesma "velha verdade" redescoberta na Reforma, a qual foi expressa com magistral beleza na Tese 62 de Lutero, onde se lê:
O verdadeiro tesouro da Igreja de Cristo é o sacrossanto Evangelho da glória e da graça de Deus.
Mas em que consistiria esse "sacrossanto Evangelho da glória e da graça de Deus"?
Sabendo-se que não é viável oferecer uma explicação detalhada, apenas direi que o Evangelho a) começa com Deus e a revelação que Ele deu de Si mesmo na Criação e, em especial, nas Escrituras (Salmo 19), por meio da qual b) chegamos ao conhecimento de nós próprios e de nossa condição de pecado (Romanos 3, vs. 9-20), o que pode nos conduzir, mediante a ação do Espírito Santo, à c) consciência de que devemos dar a devida resposta à intimação divina ao arrependimento e à fé em Jesus Cristo (Atos 17, vs. 30-31), visto que Ele julgará o mundo com justiça no Dia determinado por Seu Pai. Em outras palavras, a mensagem específica do Evangelho, que "abriu as portas do Paraíso" a um Lutero outrora angustiado em sua jornada de "auto-justificação", afirma que "Cristo morreu pelos nossos pecados segundo as Escrituras, foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras" (1 Coríntios 15, vs. 3-4), de forma que todo aquele que crê em Jesus Cristo é/será justificado/declarado "justo" perante Deus ou, usando as palavras do profeta Joel, "...todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo..." (Joel 2, vs. 32a).
Além disso, a Tese 62 de Lutero atribui ao Evangelho os termos "sacrossanto", "glória" e "graça", dos quais se deduz a sua sublimidade intrínseca - i.e., ele é singularmente puro e santo -, o peso e a dignidade manifestadas por meio dele e, finalmente, a constrangedora doçura do que nos é ofertado nele. Ou seja, é por meio do Evangelho que a justiça de Deus é revelada (Romanos 1, vs. 17) em favor de todo o que crê, de sorte que "o resplendor da glória divina" pôde (e pode) ser plenamente contemplado na pessoa de Jesus, o Nazareno, O qual "encarnou e habitou entre nós, cheio de graça e de verdade" (João 1, vs. 14), pelas quais somos "libertados do domínio do pecado" (Romanos 6, vs. 14) bem como santificados a fim de darmos fruto para Deus (João 17, vs. 17 e Romanos 7, vs. 4b). Logo, se muitos dentre os "santos" não têm tido "a justa medida da maldade", talvez o Evangelho esteja sendo esquecido por eles - ou, pior que isso, eles jamais o conheceram verdadeiramente, o que os tornaria ímpios ou "lobos em pele de cordeiro" (Mateus 7, vs. 15-23). Livre-me Deus de ser achado entre os tais!
Finalmente, às portas do 2° turno das "eleições" no Brasil (com muitas 'aspas'), ainda resta um lembrete fundamental que deve ser guardado na mente por todo que se reconhece "cristão": ter a "correta medida da maldade" também significa saber que, no fim das contas, não existe equivalência de forças entre o "mal" e o "bem" - ou melhor, entre Deus e satanás, Cristo e o mundo e entre a graça divina e o pecado. Nesse sentido, o universo não é o palco de uma "disputa entre iguais" - como se a oposição do diabo em relação a Deus fosse uma espécie de "Barcelona x Real Madrid" ou "Brasil x Argentina", onde não há favoritismo e qualquer um tem as mesmas chances de vitória -, mas o "teatro da glória de Deus" (como dissera Calvino). Como resultado, até o pecado e o próprio satanás agem "nos limites de Deus" ou, segundo uma citação relacionada a Lutero, "o diabo é o 'diabo de Deus'; ele é como um cão raivoso, mas é Deus quem controla a coleira". Assim, vale recordar as palavras do rei Davi, quando disse:
"...Por que as nações se enfurecem, e os povos tramam em vão? [...]
Aquele que está sentado nos céus se ri; o Senhor zomba deles.
Então Ele os repreende na Sua ira e os aterroriza no Seu furor, dizendo: Eu mesmo constituí o Meu rei em Sião, Meu santo monte..."
- Salmo 2, vs. 1, 4-6
Ora, se Deus zomba de quem se levanta contra Ele e, desse modo, aterroriza os Seus inimigos, os que O temem devem manter o coração pacificado apesar do crescimento do mal na sociedade e de seu triunfo aparente. Cristo já venceu a morte, ascendeu aos céus, reina à direita de Deus Pai (mas ainda não plenamente) e, muito em breve, virá outra vez para consumar o Seu reino (começando no Milênio - sim, sou um calvinista milenarista! - e continuando na "eternidade futura"). Nessa consumação, todos os Seus adversários serão destruídos e o Seu domínio será eterno.
Por fim, embora o atual estado de coisas seja marcado pelos efeitos deletérios do pecado, a graça de Deus sempre pode ser "mais abundante" (ver Romanos 5, vs. 20) que eles. O antigo pastor puritano Richard Sibbes dizia que "sempre há mais misericórdia em Cristo do que pecado em nós", sinalizando que 1) Deus é mais voluntarioso em nos conceder perdão do que nós somos para buscá-lo e 2) que, no "senso das proporções", as dádivas de Deus para nós sempre suplantam nossas ofensas a Ele. Tais benefícios, porém, só podem ser desfrutados por quem se arrepende verdadeiramente de seus pecados e crê em Cristo e, por isso mesmo, não espere até o dia 30 para dar o passo mais importante de sua vida - pois, diferentemente de um governo que deixa marcas numa sociedade que podem durar apenas por gerações, a nossa posição diante de Cristo define o nosso destino eterno.
Se você leu até aqui, restam somente algumas perguntas/considerações finais:
No tocante às questões políticas, tire a "prova dos 9", investigue a verdadeira história das diferentes idéias e movimentos existentes no mundo atual e responda: qual deles(as) são/têm sido melhores para promover o "florescimento humano" e, sobretudo, a glória de Deus?
Com base nesse entendimento, como deve ser o voto no próximo domingo? Embora essa seja uma decisão de foro íntimo, para um cristão não deve existir "autonomia" ou "livre pensamento" fora dos limites da Escritura - ora, Cristo é ou não o nosso Senhor e Rei?
Por último, e ainda mais importante: se você não acredita em Jesus como Filho de Deus e Salvador do mundo, até quando permanecerá sem levar isso a sério? Você realmente deseja apostar a Sua eternidade em vez de dar ouvidos à voz de Quem veio ao mundo para salvar pecadores como você e eu?
Pela alegria de ser liberto de toda maldade NEle,
Soli Deo Gloria!
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