quarta-feira, 25 de abril de 2012

Por que as mentiras têm teologias? - parte 4

Caros leitores,

Esse deverá ser (pelo menos por enquanto) o último post da série "Por que as mentiras têm teologias" e, por isso, espero me inspirar enquanto escrevo esse texto. As "mentiras teológicas" só se tornam cada vez mais "verdadeiras" com o passar do tempo e, como me declaro um "cristão subversivo", não consigo me calar... Pelo menos neste espaço virtual, posso expressar minhas indignações sem correr o risco de desrespeitar o outro, a despeito de minhas opiniões convictas e, por certo, bastante radicais - na maioria das vezes.


Bem... neste texto quero sintetizar os conceitos abordados nos posts anteriores e, ao mesmo tempo, falar sobre algo que me fez pensar bastante essa semana, precisamente conforme o seguinte questionamento: eu sou uma boa pessoa? 

A questão mencionada se refere, basicamente, sobre que conceito eu tenho a respeito de mim mesmo, o qual está diretamente ligado ao meu conceito sobre Deus, conforme diz as Escrituras:

"E disse Deus: façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança... E criou Deus o homem à Sua imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou." Gênesis 1:26a-27

"O Senhor olha desde os céus e está vendo a todos os filhos dos homens. Do lugar da sua habitação contempla todos os moradores da terra. Ele é que forma o coração de todos eles, que contempla todas as suas obras."
Salmos 33:13-15

"Tudo Ele fez formoso em seu tempo; também pôs o mundo [ou a eternidade, em algumas traduções] no coração do homem, sem que este possa descobrir a obra que Deus fez desde o princípio até o fim". Eclesiastes 3:11

Ora, se eu fui criado por Deus, a única alternativa para que eu saiba quem realmente sou é, primeiramente e primordialmente, conhecer Aquele que me criou. Com base nisso, a única forma de responder à pergunta "eu sou uma boa pessoa?" é descobrir o que Deus revelou em Sua Palavra a esse respeito.


Entretanto, quando esta frase - o que importa é o que Deus diz a meu respeito - é dita, normalmente caímos em uma das "mentiras" que as diversas "teologias" construíram no decorrer da história e que, como mencionado anteriormente, se converteram em "verdades" quase inquestionáveis. Logo, os subversivos como eu devem estar em maus lençóis.

Mas, que mentira é essa a que me refiro? Ei-la: nós somos pessoas boas, amáveis, virtuosas, altruístas, generosas... E mais ainda: nós amamos a Deus, nós queremos que Ele esteja no controle de nossa vida, nós O temos dentro de nós... Mentira! Não é nada disso que as Escrituras (a Bíblia) mostram. Nós não somos pessoas boas, não somos amáveis, virtuosos, altruístas, generosos... E mais do que isso: não amamos a Deus, não queremos que Ele controle a nossa vida e não O temos dentro de nós. Mas, num ímpeto descontrolado, você pode estar aí em frente de seu computador e dizendo:

"Esse blogueiro é um inconsequente! Ele está delirando! É claro que eu tenho Deus no meu coração! Eu faço o bem às pessoas, eu não mato nem roubo... Eu sempre fui da igreja, até cantei no coral e já 'ganhei' muitas pessoas pra Jesus..."


Veja bem: a nossa base para qualquer conceito (principalmente para os que se declaram cristãos) deve ser somente a Bíblia, pois ela mesma diz: "... a Tua Palavra é a verdade ..." (João 17:17b). Mas, afinal, o que a Bíblia diz sobre mim além de que fui criado por Deus e que ele forma o meu coração de modo que eu não possa entender a sua obra desde o início até o fim? Para isso, quero me recorrer ao que alguns chamam de "Acrópole das Escrituras" - o texto da Epístola do Apóstolo Paulo aos Romanos, capítulo 3, versículos 9 ao 28, dos quais destacarei alguns como segue:

"Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus... Sendo justificados gratuitamente pela Sua graça, pela redenção que há em Cristo Jesus... Ao qual Deus propôs para propiciação, pela fé no Seu sangue, para demonstrar a Sua justiça pela remissão dos pecados anteriormente cometidos, sob a paciência de Deus... Para demostrar a Sua justiça neste tempo presente, a fim de que Ele seja justo e justificador daquele que tem fé em Jesus... Onde está, então, o motivo de vanglória? É excluído. Por qual lei? Das obras? Não, mas pela lei da fé. Concluímos, pois, que o homem é justificado pela fé sem as obras da Lei". Romanos 3:23-28

Primeiramente, não existem pessoas boas porque TODOS PECARAM. Todos - Hitler, Mussolini, o maníaco do parque, eu, você - são pecadores e, mais do que isso, todos são igualmente pecadores e sujeitos ao julgamento de Deus (eu não sou melhor do que Mussolini nem você é melhor do que o casal Nardoni), pois o mesmo texto de Romanos 3 diz que "...nós sabemos que o que a Lei diz, aos que estão debaixo da Lei o diz, para que toda a boca esteja calada e todo o mundo seja condenável diante de Deus..." (vs. 19). Todos somos condenáveis diante Dele. Todos nós temos de calar a nossa boca diante Dele. Ele é o Justo Juiz. Ele odeia o pecado e derrama Sua ira contra todos os que praticam o mal (Salmos 5:4-5 e Romanos 1:18-19). Quanto atrevimento nosso achar que somos bons, pois Jesus disse ao jovem rico (o qual se achava acima do bem e do mal por causa de sua religiosidade exemplar) "...não há ninguém bom, senão um só, que é Deus..." (Mateus 19:17). Estamos em uma masmorra espiritual e não temos a chave conosco, nem temos poder algum para encontrá-la. Só Deus é bom de fato, e ponto final - para complementar esse raciocínio: Salmos 14, Romanos 3:9-18, Jeremias 17:9, Isaías 64:6 e Mateus 15:18-20.


Por outro lado, o texto de Romanos traz algo ainda mais assustador, ao dizer que Deus nos considera justos (somos justificados) gratuitamente por Sua própria graça - somos presenteados por Deus sem motivo algum para isso. Isso é alucinante e deve produzir em nós um temor profundo diante de Deus, pois esse "presente sem motivo" custou a vida do Seu Filho - o qual foi morto numa cruz para remissão dos pecados de todos aqueles que creem em Seu nome. Na verdade, só poderemos entender melhor a sublimidade do amor de Deus em Cristo pelos pecadores se reconhecermos intensamente o quanto somos indignos desse amor e, por conseguinte, só poderemos reconhecer que somos absolutamente indignos do amor de Deus quando vermos o quanto somos pecadores e, finalmente, só poderemos saber a seriedade de sermos pecadores maus e desesperadamente corruptos ao conhecermos a Deus - um Ser único, infinito, perfeito, completamente santo e puro, justo e reto em seu caráter e que não tolera nada que seja mau. Logo, tudo sempre acaba onde tudo começa: conhecer a Deus é a razão preeminente de nossa existência - conforme a velha assertiva que afirma que "o fim supremo do homem é glorificar a Deus e desfrutá-Lo plena e eternamente". 

Finalmente, o texto de Romanos 3 derruba qualquer motivo de vaidade ou orgulho de nossa parte, pois está escrito que Deus demostra a Sua justiça "para que Ele seja justo e justificador daquele que tem fé em Jesus". Deus é o justificador. Ele é quem faz a justiça ser concreta. Eu não sou meu próprio justificador; Ele é quem me justifica (Romanos 8:33). Pensando bem, como um ser corrupto e pecador como eu poderia se justificar, se eu mesmo estou tão longe de qualquer padrão de justiça? Só me resta agradecer a Deus porque existe Alguém que tem todos os requisitos para ser Justo e Justificador. Se você é um cristão, seja muito grato a Ele por isso... muito grato mesmo. A gente não tem ideia do supremo valor dessa justificação. Paulo conclui, então, dizendo com muita segurança e propriedade: 

"Onde está pois, o motivo de vanglória? É excluído. Por qual lei? Das obras? Não, mas pela lei da fé". (cap. 3, vs. 27).

Se nos orgulhamos de sermos salvos por Deus, somos todos idiotas e inúteis petulantes. Não tem que haver qualquer centelha do orgulho em mim nem em você por isso. Mas você pode até dizer: "...eu cri no evangelho, eu coloquei a minha fé em Cristo...". Não, você não poderia colocar algo que você não teve antes de Deus te dar, pois a Bíblia diz que a fé para a salvação vem de Deus (Efésios 2:8 e Romanos 10:17). Ninguém tem a fé para a salvação; Deus é quem nos dá isso como Lhe agrada (Atos 11:18, Atos 13:48 e João 1:12-13) e, portanto, não há razão para nos sentirmos superiores. Ao contrário, devemos sim sermos humildes, nos rebaixarmos ao nosso lugar de míseros pecadores - "vermes", como diz a célebre canção do John Newton "Amazing Grace" - e darmos TODA a glória a Quem de fato é digno dela (Romanos 11:36). 


Sim... a "maravilhosa graça veio com o seu doce som e salvou um verme como eu..." Sim, um verme como eu, como você, como todo pecador que, arrependido dos seus pecados, foi conquistado pelo eterno amor do Cristo crucificado e que ressuscitou... "Antes eu era perdido, mas agora fui achado... era cego, mas agora eu vejo..." A graça nos traz à Luz, nos tira das trevas, nos dá vida enquanto ainda éramos mortos. Como cair na "mentira teológica" de que sou bom? Como muitos de nós ainda estão se enganando com um pseudoevangelho da autoestima humana? Chega de cultivar a autoestima! É preciso cultivar, na verdade, a baixa-estima humana, cultivar a realidade de nossa miséria espiritual para que, quando olharmos para Cristo, não termos outra reação a não ser nos entregar a Ele inteiramente, humildemente, alegremente e em completa adoração e admiração ante a Sua maravilhosa graça, ante a Sua suprema grandeza, ante a Sua completa santidade... enfim, ante ao Deus das Escrituras. 

Diante de mais uma "mentira teológica" desmascarada, só me resta dizer...



Soli Deo Gloria!

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Por que as mentiras tem "teologias"? - parte 3

Caros leitores,

Nos últimos dois textos aqui publicados, eu comecei a abordar algumas realidades presentes no ambiente religioso "cristão" que têm me preocupado bastante, mediante o seguinte questionamento: "por que as mentiras tem teologias"? Primeiramente, eu fiz uma explanação mais geral, apresentando o conceito "teologia" e mencionando, ainda que superficialmente, determinados aspectos que mostram a decadência vigente na cristandade. No texto seguinte, eu abordei de modo mais detalhado o problema da concepção antibíblica de Deus por parte das pessoas - e, desse modo, por parte dos próprios cristãos - no tocante à soberania de Deus, pela qual esta é "diminuída" ou mesmo "subordinada" pela pretensiosa vontade humana. Por outro lado, este texto de hoje poderá ser ainda mais polêmico e confrontador, pois minha intenção é discutir o que eu chamo de "Soli Ecclesia Gloria" ou "À igreja somente seja a glória" - parafraseando o título deste blog, o qual se refere a um dos pilares da Reforma Protestante.


"Soli ecclesia gloria... como assim?" - você pode estar se perguntando agora.

Bem, estamos vivendo uma época de caos. Diante de tantos desvios da verdade e da simplicidade das Escrituras, nota-se um movimento ainda emergente dentro da comunidade cristã no mundo (e, nesse caso, quero destacar o Brasil) que tem procurado resgatar os valores do Evangelho como eles são, sem barganhas, adaptações ou qualquer maquiagem. Uma minoria, é verdade, mas já tem sido muito gratificante enxergar esse despertar na direção de Cristo e centrado-se Nele pois, como eu sempre menciono, as Escrituras dizem que "...nele vivemos, nos movemos e existimos..." (Atos 17:28a) bem como que "...para nós há um só Deus, o Pai, de quem são todas as coisas e para quem vivemos; e um só Senhor, Jesus Cristo, pelo qual são todas as coisas, e nós também por Ele..." (1 Coríntios 8:6). Mas, infelizmente, existe um risco tão sutilmente trágico, sobremodo iminente e cada vez mais próximo de cada um daqueles que têm diligentemente buscado conhecer a verdade e, assim, serem livres - o risco do orgulho pelo conhecimento da verdade. 

Essa é a "mentira" mais sutil que as "teologias" (principalmente as teologias saudáveis, infelizmente) podem trazer: a mentira de que eu sou melhor do que o outro porque a minha teologia é mais correta, porque a liturgia de minha igreja é mais parecida com a liturgia dos meus antepassados cristãos - logo, sou mais fiel às heranças históricas - , porque os meus "métodos de evangelismo" são mais "bíblicos" do que os dos demais movimentos cristãos... Eu me revolto quando percebo o quanto que muitos daqueles que Deus têm, por sua graça, trazido de volta ao Evangelho de Cristo, estão sendo sorrateiramente seduzidos pela "vaidade da boa teologia" e do "evangelismo bíblico" e, nesse afã de parecerem melhores do que os demais cristãos que não têm uma "boa teologia" ou que não sabem "evangelizar biblicamente", discriminam, excluem, difamam e fazem críticas ferinas a todos os que não pensam ou agem como eles próprios. Na verdade, estou tão cansado das deturpações da sã doutrina feitas por muitos que se dizem "cristãos" como também do orgulho inútil e perverso de alguns outros  - que também se dizem "eleitos de Deus" - por causa de uma "boa teologia". Ambos os comportamentos são igualmente nocivos e destrutivos. 


Nesse contexto, talvez o aspecto mais digno de ser ressaltado é que, infelizmente, muitos  têm se inflado em si mesmos (inclusive nós mesmos) porque em suas igrejas a liturgia é "mais bíblica" do que aquela existente nas demais congregações, bem como porque esses "cristãos detentores das patentes da verdade bíblica" se julgam os melhores pregadores do evangelho do pedaço... Ou seja, "Soli Ecclesia Gloria" - glórias à minha igreja, pois eu "boto pra quebrar!" Eles dizem (ou, às vezes, somos nós que dizemos): "...eles dizem o velho jargão "Deus ama você e tem um plano maravilhoso para sua vida" ou, ainda pior, estão inventando moda ao fazerem apresentações de música na faculdade com música secular incluindo seus testemunhos pessoais nos quais falam do evangelho de forma muito superficial..." Sim, eu concordo que devemos ser zelosos de nossa pregação - mesmo que usemos de estratégias diversas para nos conectarmos com as pessoas - e pregarmos somente Cristo (1 Coríntios 1:18-2:5) sem enfeites ou acréscimos... Mas, por outro lado, se pensamos que Deus só pode alcançar as pessoas que foram "evangelizadas corretamente", estamos pisando na soberania de Deus na salvação, como dizem as Escrituras:

"Todo o que o Pai me dá virá a mim; e o que vem a mim, de maneira nenhuma o lançarei fora. Porque eu desci do céu não para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou. E a vontade daquele que me enviou é esta: que nenhum daqueles que Ele me deu se perca, mas que eu o ressuscite no último dia.
[...]
Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, o não trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia. Está escrito nos profetas: 'E todos serão ensinados por Deus'. Portanto, todo aquele que do Pai ouviu e aprendeu vem a mim". 
[João 6:37-39 e 44-45].

"E, quando eu for levantado da terra, a todos atrairei a mim". [João 12:32].


Ou seja, não é a igreja quem atrai as pessoas a Cristo pela sua "pregação correta" do Evangelho, é Cristo quem atrai as pessoas que Ele quer a Ele mesmo. Sim, Ele faz isso por meio da pregação da Palavra (e, obviamente, a Palavra é pregada por alguém) mas, no fim das contas, Ele não tem a menor necessidade de você nem de mim para convencer o pecador de sua situação de condenação e, assim, atraí-lo a Cristo pelo arrependimento e pela fé no Evangelho, o qual é o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê (Romanos 1:16). É preciso dar um "basta" nessa mentira de que eu "ajudo Deus" a salvar as pessoas e (pior ainda) na mentira de que, se eu não pregar a mensagem dentro dos "padrões", Deus não pode salvar ninguém. Que petulância idiota essa nossa! Deus pode salvar quem Ele quiser sem intermediários humanos, intelectuais ou argumentativos, pois Ele diz:

"Olhai para mim, e sereis salvos, vós, todos os termos da terra; porque eu sou Deus, e não há outro". [Isaías 45:22]

A questão aqui é olhar para Deus, e não olhar para a igreja A ou B. A Bíblia não diz "olhem para a igreja A, B ou C e vocês serão salvos", mas diz sim para olharmos para Ele a fim de sermos salvos. Além disso, o texto diz que a ordem de Deus é para que pessoas em todos os lugares (todos os termos da terra) olhem para Ele - somente isso: "olhem para Mim, eu sou Deus e não há outro"! A minha igreja local não é Deus. A sua igreja local não é Deus. Deus é que é Deus e nós temos que reconhecer o nosso lugar de criaturas, criaturas igualmente carentes da Graça Sublime, do Amor Eterno, da Misericórdia Sem Fim, da Bondade Inefável. Logo, a glória não é da minha igreja, não é da sua igreja. Ou seja, a glória não é sua e muito menos minha. A glória é toda Dele mas nós, com nossa arrogância doentia e atrevida, queremos a glória para nós - ora, nós somos "seguidores do evangelho bíblico", somos "pregadores da verdade das Escrituras", somos "leais à doutrina de Cristo" e os outros... os outros são todos errados! "Deus, a glória é um pouco nossa também!" Deus pode salvar quem Ele quiser, até mesmo aqueles que foram "erradamente evangelizados", pois Deus não está limitado aos métodos de evangelismo que usamos ou deixamos de usar... Ou melhor, Deus não está limitado a nada, não é? Ah, como se diz na Bahia: me deixe, viu!


Enfim... quero encerrar o texto mencionando as palavras do Apóstolo Paulo em 1 Coríntios 3:6-7, onde se diz:

"...Eu plantei, Apolo regou, mas Deus deu o crescimento.
Por isso, nem o que planta é alguma coisa, nem o que rega, mas Deus, que dá o crescimento..."

Eu não sou nada. Você não é nada. Ninguém vale nada. Só quem tem valor nisso tudo é Deus, pois Ele é quem faz as coisas acontecerem. Mais claro, impossível.



Enfim, eu grito com toda força: Não ao "Soli Ecclesia Gloria", pois o único lema que vale é o...



...Soli Deo Gloria!

terça-feira, 10 de abril de 2012

Por que as mentiras tem "teologias"? - parte 2

Caros leitores,

Como disse no post anterior, pretendo apresentar nos próximos textos uma série de reflexões sobre as "mentiras" das diversas manifestações teológicas que, mais do que em qualquer outro tempo na história, têm sido cada vez mais comuns no meio religioso e, especialmente, no meio cristão. 


No texto anterior, eu mencionei alguns aspectos que têm me preocupado, os quais, por outro lado, fazem parte do que as próprias Escrituras já haviam dito que aconteceria, como está escrito: "...pois chegará o tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si mesmos doutores conforme os seus próprios maus desejos; e desviarão os ouvidos da verdade, voltando às fábulas" (2Timóteo 4:3-4). Logo, de certa forma, aqueles que Deus tem, por sua Graça, conservado na verdade e na simplicidade que há em Cristo, não devem se perturbar com todas essas coisas pois, como já comentei em algum texto (como a própria Bíblia diz), Jesus está edificando a Sua Igreja como Ele mesmo disse que faria (vide Mateus 16:18). E, se Jesus disse que edificaria a Sua Igreja, a vontade de Jesus não pode ser frustrada (Jó 42:2).

Bem, neste texto, quero me deter em um aspecto que, no fim das contas, é o epicentro de todo desvio da verdade, a essência de toda heresia, a fonte de toda "mentira" teológica: a nossa concepção errada de quem Deus é. Especificamente, quero tratar sobre a inversão dos papéis, ou melhor, a inversão da realidade, segundo a qual Deus é soberano, mas não é tão soberano assim... Ou seja, Deus tem seus planos mas, no fim das contas, sou eu quem determino o meu destino. Na verdade, é a minha vontade que prevalece, sou eu quem dou os passos fundamentais e ajudo Deus a cumprir o propósito Dele em mim e, obviamente, se eu não quiser, Deus não pode fazer nada em minha vida. Será?




Em primeiro lugar, só existem duas alternativas: ou Deus é absolutamente soberano ou chamá-Lo "Deus" não faz o menor sentido. Por exemplo, se Ele é 80% soberano e 20% dependente das vontades humanas, Ele pode ser considerado como qualquer outra coisa, menos como Deus. Mas, será mesmo que a "diminuição" da soberania de Deus (ou mesmo a anulação dela) por parte de nós, seres humanos, é a raiz de todo desvio da verdade? E, em caso positivo, o que justifica(ria) essa minha afirmação tão categórica?

Biblicamente falando, não há qualquer margem para dúvidas sobre a soberania absoluta de Deus. As Escrituras dizem: "O nosso Deus está nos céus e faz tudo o que lhe apraz" (Salmos 115:3), "O Senhor estabeleceu o Seu trono nos céus e o Seu reino domina sobre tudo" (Salmos 103:19), "O Senhor fez todas as coisas para os seus próprios fins; até o ímpio, para o dia do mal" (Provérbios 16:4), "Eis que tudo quanto Deus faz durará eternamente; nada se lhe deve acrescentar e nada se lhe deve tirar; e Deus faz isso para que haja temor diante Dele" (Eclesiastes 3:14). Existem muitas outras referências que corroboram o que estes versículos mencionados dizem: Deus faz sempre o que Lhe agrada, o trono Dele está nos céus e Ele domina sobre tudo, Ele fez todas as coisas para fins específicos e, diante disso, nada pode ser acrescentado ou removido, visto que o que Ele faz dura eternamente e, por isso, todos os homens devem temê-Lo, honrá-Lo e reverenciá-Lo como Ele é: o Deus soberano, o Rei eterno, o Senhor de todas as coisas. 




Quando penso no real significado da soberania de Deus, a primeira coisa que me vem à mente é uma absoluta "falta de reação". Na verdade, a soberania de Deus nos paralisa, nos constrange, nos deixa sem chão, nos impressiona, nos envergonha; enfim, ela nos humilha. Portanto, uma vez que somos, de fato, insignificantes e pequenos diante do Criador (Isáias 40:12-26), a compreensão do real significado da soberania de Deus nos incomoda, exatamente por nos fazer enxergar quem realmente somos, e não aquilo que gostaríamos de ser e que, na verdade, nunca seremos - seres autossuficentes, independentes dos outros e, claro, independentes e sem qualquer responsabilidade para com Deus. Queremos ser nossos próprios deuses - queremos decidir nosso destino, queremos replicar com Deus quando sua Palavra diz aquilo que não gostaríamos que ela dissesse, queremos definir os destinos das outras pessoas e, o pior de tudo, queremos dizer o que Deus deve fazer - ; porém, como é se de esperar, o resultado sempre é o mesmo de Gênesis 3: caímos no engano da serpente e tentamos nos esconder de Deus sem sucesso algum. Deus é Deus; nós não somos. Como disse Pascal: "Deus fez o homem à Sua própria imagem e  semelhança; em troca, o homem fez Deus conforme à sua imagem".


Finalmente, a soberania de Deus traz consigo um dos conceitos mais importantes (se não for o mais importante) das Escrituras: a glória de Deus. Está escrito: "Porque dele, por Ele e para Ele são todas as coisas. A Ele seja a glória eternamente, amém" (Romanos 11:36). Isto é: o fim de todas as coisas é a glória de Deus, é o próprio Deus. Um catecismo do qual gosto muito diz: "O fim supremo do homem é glorificar a Deus e gozá-Lo plena e eternamente" - Catecismo Maior de Westminster. Não há como "acertar o alvo" da existência se buscamos algo diferente da glória de Deus; não há como se desfrutar de Deus e de sua companhia se não for pela glória de Deus e para a glória do próprio Deus. Como diz uma certa música:


"[...]
Então, me diz qual é a graça 
De já saber o fim da estrada
Quando se parte rumo ao nada?
[...]"
(A seta e o alvo - Paulinho Moska)





Não há satisfação para nós quando estamos caminhando para "lugar nenhum". Não adianta dizer "relaxa, eu sei o que estou fazendo", se o fim de tudo é uma grande ilusão. "...nEle (em Deus) vivemos, nos movemos e existimos...", é o que diz a Escritura. 


Sendo bem categórico e um tanto drástico, não são as nossas intenções que definem o que glorifica a Deus ou não; é a glória de Deus que deve definir o que devemos intencionar fazer ou não fazer (1 Coríntios 10:31). O que importa é agradar a Deus e não aos homens (Atos 5:29, Gálatas 1:10). E mais do que isso: como diz certo escritor que admiro muito, "Deus é mais glorificado em você quando você está mais satisfeito Nele". O que podemos fazer que mais pode glorificar a Deus é nos satisfazermos Nele, é priorizarmos conhecer a Ele; enfim, é amá-Lo de todo o coração, alma, entendimento e forças (Mateus 22:38, João 17:3).  


Eu não entendo a soberania de Deus mas, exatamente pelo fato de Ele ser totalmente soberano e, ao mesmo tempo, perfeito e justo em todos os Seus caminhos, assim como longânimo e bondoso em todos os Seus atos (Salmos 145:4-8 e 17), posso confiar no Seu controle sobre tudo o que me cerca e saber que Ele fará sempre o melhor que poderia se feito... Um dia, porém "veremos face a face e conheceremos como somos conhecidos..." Você já se deu conta disso?






Soli Deo Gloria!

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Por que as mentiras tem "teologias"?

Caros leitores,

Já estava na hora de eu colocar a minha cabeça para funcionar e escrever algo de mim mesmo por aqui... não é mesmo?

De vez em quando, no meio da minha rotina mesmo, eu penso em alguma coisa interessante - normalmente, em frases de músicas que escuto em meu mp3 - e tento poetizar em cima daquela mensagem, de modo a fazer com que vocês, amigos leitores, pensem um pouco sobre si mesmos, sobre a vida e, mais do que tudo, sobre Aquele que é a razão de ser dela. 

Mas, sem mais delongas, vou deixar os pensamentos fluírem!


Ontem foi 1º de abril, um dia conhecido como o "Dia da mentira". Na minha época de escola (particularmente, na escola primária - do 1º ao 5º ano), era muito comum ver os meus colegas tentando "pregar peças" uns nos outros nesse dia. Normalmente, eles diziam coisas como: "você foi chamado pra ir na sala da diretoria", ou "hoje vai ter prova surpresa de matemática, você sabia?". Bem, às vezes eu também era alvo dessas "peripécias" - o que quase sempre me chateava - mas, depois de um tempo, comecei a estar na defensiva e desconfiava de tudo o que era dito na escola no 1º de abril. Resultado: os meus amigos da escola nunca mais conseguiram me "passar pra trás". Dilemas superados, enfim.

Mas o título deste post contém uma questão muito mais controversa e instigante do que as antigas "peripécias" do "Dia da mentira", tão comuns na minha, na nossa tenra infância. Mas, antes de considerarmos essa pergunta, devemos pensar no seguinte: o que é teologia? Terminologicamente, teologia é uma palavra resultante da junção de dois termos gregos (teos = Deus e logos = tratado, estudo); logo, a palavra teologia significa "estudo sobre Deus", "tratado sobre Deus" ou algo semelhante. Eu, por outro lado, prefiro dizer que "teologia" é um meio que nos ajuda a chegar a um "conhecimento de Deus" em certo nível, pois a Bíblia diz: "...Porque em parte conhecemos e em parte profetizamos... Agora conheço em parte; mas então conhecerei como também sou conhecido..." (1Coríntios 13:9 e 12b). Ora, se a "teologia" é o "estudo sobre Deus" ou mesmo algo pelo qual podemos ter certo "conhecimento de Deus", faz sentido dizer que "mentiras tem teologias", visto que em Deus só existe verdade? (ver Romanos 3:3-4, João 14:6,17 e 1 João 5:6). Como solucionar esse paradoxo?


Para começar, gostaria de dizer que a teologia, como forma de conhecimento, é um produto da mente humana (não quero dizer com isso que todas as teologias estão erradas, nem que todas estão corretas - o princípio aristotélico da "não-contradição" afirma que só pode existir um conceito realmente correto dentre conceitos antagônicos entre si) e que, por ser assim, leva consigo as impressões dos pensamentos e indagações humanas; na verdade, a teologia é também filosófica em seu sentido mais ontológico, ou seja, ela é filosófica em sua essência. Ora, se a teologia é um produto dos questionamentos e das reflexões dos homens, as múltiplas manifestações teológicas podem estar (e normalmente estão) repletas de inverdades, de distorções, de mentiras. Por quê? "...Não há um justo, nem um sequer. Não há quem entenda; não há ninguém que busque a Deus. Todos se desviaram e juntamente se fizeram inúteis; não há quem faça o bem, não há sequer um. A sua garganta é um sepulcro aberto; com a língua tratam enganosamente; veneno de áspides está debaixo de seus lábios; cuja boca está cheia de maldição e amargura; os seus pés são ligeiros para derramar sangue inocente; em seus caminhos há destruição e miséria; eles não conheceram o caminho da paz e não há temor de Deus diante de seus olhos" (Romanos 3:10-18). Simplesmente por isso. Está claro.

Os homens estão com a sua mente cauterizada em relação a Deus (Efésios 4:17-19). Logo, eles não podem criar um conceito correto de Deus a não ser que o próprio Deus se revele a eles (Mateus 11:25-27, João 1:18). Mas, na prática, o que significa dizer que "as mentiras tem teologias"? Quando penso nisso, não posso deixar de lembrar a legitimamente triste e lastimável realidade que se destaca no meio dito "cristão": escândalos morais, fazendas avaliadas em milhões de reais, dívidas exorbitantes para com funcionários de televisão, manipulação das massas em nome do enriquecimento próprio, "entrevistas" com o diabo para mascarar uma disputa por mais fiéis e espaço na mídia, os dólares não declarados, o "endeusamento" do homem e a inconcebível "diminuição" da soberania divina... Enfim, o que mais se vê pode ser resumido com "desobediência à verdade e a obediência à iniquidade" (2Tessalonicenses 2:9-12). Sim, as mentiras tem teologias; se pensarmos bem, isso já era uma realidade desde os tempos bíblicos, pois Jesus disse os judeus que o rejeitaram: "...Porque não entendeis a minha linguagem? Por não poderdes ouvir a minha palavra... Vós tendes por pai ao diabo, e quereis satisfazer os desejos do vosso pai. Ele foi homicida desde o princípio e não se firmou na verdade, porque não há verdade nele. Quando profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso e pai da mentira... Mas, porque vos digo a verdade, não me credes..." (João 8:43-45). Esses judeus se julgavam filhos de Abraão (ou parte do povo de Deus) porque conheciam a Lei e também com base na justiça própria, mas Jesus disse quem eles eram de fato. As mentiras tinham e ainda têm suas teologias. 


Mas, em tudo isso, a minha preocupação é comigo mesmo. Será que minhas teologias são todas verdadeiras? Que Deus tem norteado a minha vida? Que concepção de Deus eu tenho construído? Uma coisa é certa: a nossa concepção de Deus norteia todos os aspectos da existência. Se a minha perspectiva Dele não é verdadeira (isto é, se o Deus em quem eu creio é diferente do Deus da Bíblia - logo, esse Deus é uma grande mentira), tudo o mais estará comprometido. Ora, como disse Pascal: "Deus fez o homem à Sua imagem e semelhança e, em troca, os homens fizeram Deus à sua própria imagem". Parece-me que cada um de nós tem um "deus particular" dentro da mente e, especialmente por causa disso (assim eu creio), o mundo está nessa "crescente entropia comportamental e conceitual", onde a crise de identidade seja, talvez, o mal do século. Seguramente, a única resposta para esse dilema é: conheçamos a Deus e, consequentemente, conheceremos quem de fato somos e qual é o nosso lugar no grande filme da vida - cujo roteiro Ele mesmo escreveu, o qual Ele mesmo está dirigindo e do qual é também o Protagonista. Sim, pois a Escritura diz: "...porque Dele, por Ele e para Ele são todas as coisas; a Ele seja a glória para sempre, amém" (Romanos 11:36). Não há meio termo. 

Existem muitos aspectos dos quais gostaria de tratar sobre o tema deste post. Por isso, acho que os próximos textos darão continuidade a essa temática. Finalmente, meu desejo é que todos os amigos que visitam esse blog (assim como eu mesmo) sejam motivados a caminharem na verdade todos os dias e em cada momento, como diz certa música: "...Vivo a eternidade no meu dia-a-dia...", e ainda outra: "...Quero te ver como Tu és, não como imagino mas como Tu és... Quero ouvir Tua Palavra, não como imagino mas o que ela diz...". Nada mais consolador do que saber que esse "caminhar na verdade" não depende de minhas forças, mas da operação Dele em nós, como está escrito: "...E sabemos que o Filho de Deus é vindo, e que Ele nos deu entendimento para conhecermos o que é verdadeiro, e no que é verdadeiro estamos, isto é, em seu Filho Jesus Cristo; este é o verdadeiro Deus e a vida eterna" (1João 5:20). 


Em meio às "mentiras que têm teologias", que Ele nos ajude a permanecer na verdade e lutando pela verdade, pois "nada podemos contra a verdade, a não ser a favor da verdade"! 




Soli Deo Gloria!